28 de março de 2024
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Preocupação com meio ambiente e qualidade de vida marcam o mandato de Eduardo Romero

Sem fugir de temas polêmicos, com amplo conhecimento em meio ambiente e sustentabilidade, o vereador Eduardo Romero tem uma trajetória sólida e coerente já nos seu primeiro mandato.

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Eduardo Romero, nosso entrevistado, é jornalista, professor e ator. Mestre em Comunicação Social, pós-graduado em Didática e Metodologia do Ensino Superior e acadêmico de Direito.

Foi presidente da Associação de Moradores do Bairro Universitário, em 2001. Em 2008 disputou as eleições municipais conquistando a suplência pelo PV. Em 2012 foi eleito pelo PTdoB e ocupa a presidência da Comissão de Meio Ambiente, vice-presidente da Comissão de Finanças e Orçamento e da Comissão de Cultura. É coordenador na região Centro-Oeste da Frente Parlamentar de Vereadores Ambientalistas, que foi implantada no Mato Grosso do Sul em 2014.

Os governos municipais, desde há muito, estão tratando sem a devida importância a questão das matas ciliares, ou fundos de vale, permitindo construções como as do programa “Minha Casa, Minha Vida”, onde foram feitas construções nestas áreas que foram doadas pela administração municipal, e a contrapartida eram terrenos de maior extensão, mas em outras áreas, longe dos mananciais. Como o senhor, que tem um excelente trabalho na área ambiental, se posiciona em relação a isso?

Esse é um assunto muito sensível para o crescimento de Campo Grande, que ficou conhecida nacionalmente como uma cidade que não respeita fundos de vale. Essas são áreas com baixo valor imobiliário, por serem áreas alagáveis, ou alagadas, margeando beiras de córregos, ou nascentes, popularmente conhecidos como brejos. Se você fizer um trabalho de estruturação, com valas ou drenos, você consegue utilizar essas áreas.

O problema é que essas áreas têm uma responsabilidade grande no fluxo dos córregos de Campo Grande, e não é de hoje que nós temos essa política de avançar sobre os fundos de vales fazendo uma troca que eu não considero justa. Como você colocou, nós damos uma área bem localizada, como nós temos, por exemplo, o Jardim dos Jatobás, na Avenida Afonso Pena, em frente ao Shopping Campo Grande, construído ao lado de um córrego. Pela legislação ambiental, nunca aquele complexo de prédios poderia ter sido construído ali.

Tanto que houve um sério problema de erosão, desabamentos, alagamentos...

Sim, e começou ocupando a área da [Av.] Afonso Pena e hoje a gente está ocupando toda a área da [Avenida] Ricardo Brandão. Ou seja, desrespeitou por completo, numa tratativa que diz: vou doar essa área, a empresa vai utilizar e nos recompensar. Mas recompensar de que forma? Ela vai construir uma escola, ou uma creche, ou adotar uma praça... sempre é essa a contrapartida social que a Prefeitura recebe. Claro que isso é importante, mas do ponto de vista ambiental, isso é um perigo muito grande.

Você esgota essas áreas que não são perdidas, são de muito valor para o ecossistema, porque elas são áreas de recarga, onde você tem afloramento do lençol freático muito superficial que mantém os recursos hídricos.

Em Campo Grande nós temos 23 córregos, todos de pequeno e médio portes, sendo que o maior, o Córrego Anhandui.

Apesar de ser considerado na planta urbana como rio...

Mas não naquele padrão caudaloso, ele é o grande receptor da rede de esgotamento sanitário da cidade, das águas pluviais, portanto ele não tem muita vida, e é classificado como de não portabilidade cujas águas não podem serem usadas sequer para irrigação. Quando você não cuida dos recursos hídricos, você pode vir a ter problemas como os enfrentados por São Paulo, parte de Minas Gerais, Rio de Janeiro.

Quando a gente fala em cuidar dos recursos hídricos, não é só dizer que estamos mantendo os córregos da cidade. Tem que cuidar dos fundos dos vales, quando você vai cuidar da água superficial e subterrânea, da mata ciliar. Hoje o código florestal reduziu a área lateral às margens, que antes eram medias a partir da calha maior do córrego, e hoje se usa por base a calha menor, o que diminui drasticamente essa faixa de mata.

Nos casos de córregos urbanos você tem um agravante, que é o interesse social, que significa definir o que é mais importante para a Cidade, para o coletivo, nesse momento. É manter esse córrego com as características naturais, ou fazer a urbanização com a construção de avenidas?

Seguida de construções para os mais diversos fins.

Sim, o que se chama de antropizar [neologismo que significa 'uso indevido da terra pelos seres humanos] essa região. Com isso nós perdemos. Na [Rua] Maracaju tem um córrego soterrado, parte do córrego prosa na [Avenida] Fernando Correa da Costa, o Anhanduizinho que, mesmo aberto, é cimentado nas laterais e na calha final,

O segredo inclusive que é totalmente cimentado.

Então, isso fez com que a cidade comece a ter problemas com o volume de chuvas. Ou seja, quando se optou por estas soluções, não se tinha o volume de chuvas de hoje, que chega a 80mm³ em apenas algumas horas.

É preciso levar em conta que a área de drenagem nas diversas regiões da cidade, são muito menores em função do crescimento da cidade.

E quando se fala em área de drenagem, deve-se considerar o papel da árvore da regulação do solo. A árvore faz o amortecimento das águas da chuva, provocando um gotejamento que permite melhor absorção pelo solo, além de suas raízes possibilitarem a penetração dessa água mantendo o solo umedecido por mais tempo e permitindo sua passagem para o lençol subterrâneo. Excluídas as árvores nós temos o efeito de enxurrada que leva a água e os detritos para os córregos, provocando o assoreamento.

Nós precisamos ter um cuidado especial com o meio ambiente. Hoje eu presido a Comissão Especial de Meio Ambiente e, temos tentado mostrar em nossas discussões nos projetos que passam por nós, e nem todos passam pela Câmara, alguns são de iniciativa direta do Executivo. Quando é um projeto do Prodes [Programa de Desenvolvimento Econômico e Social], que vai conceder diversos benefícios e isenções, nós analisamos criteriosamente qual é a relação desse projeto com o meio ambiente. Não  adianta apenas ficar no discurso de gerar renda e emprego e esquecer que a gente depende da sustentabilidade para que isso aconteça de fato.

Eu tenho uma preocupação muito grande com essa ocupação dos fundos de vale. Essa coisa de permutas dessas áreas com empresas foi uma característica do governo Nelsinho, mas que hoje não tem ocorrido até em função das críticas que recebeu. À época, eu não era vereador, fazia parte do movimento ambientalista e do Conselho de Meio Ambiente, e isso foi denunciado ao Ministério Público. Aliás existem muitas ações em trâmite questionando este tipo de atitude.

A questão do “bicicletário”; não é um contrassenso criar a lei, sabendo, como aconteceu, de ser mais uma “lei que não pegou”?

Eu não diria que é uma “lei que não pegou”. Na verdade, nós vivemos num país onde se precisa instrumentalizar as políticas públicas. Nós não podemos deixar que só a vontade do gestor faça as coisas acontecerem, então, qual a forma de que a política pública prevaleça sobre a vontade do gestor? Criando leis. Infelizmente precisamos desse instrumento legalista. Se não tem esse instrumento, não tem como exigir que isso aconteça.

A lei dos bicicletários passou por um processo de construção, com audiências públicas, reuniões com grupos de ciclistas, empresários etc. Hoje a iniciativa privada já tem alternativas, principalmente as que estão localizadas nas zonas mais periféricas, têm funcionários cujo meio de transporte é a bicicleta, e dispõe de espaços próprios. Hoje a lei está instituída, sancionada, mas agora nós temos um instrumento legal para cobrar. Na semana passada tivemos uma reunião com o secretário da Seintrha [Secretaria Municipal de Infraestrutura, Transporte e Habitação], Valtemir Britto, e cobramos a agilização. Se não podemos fazer em todos os órgãos, porque temos duas leis aprovadas: a que obriga o bicicletário em todos os prédios públicos,  e a que já está aprovada pela Câmara, mas ainda não sancionada pelo Prefeito, que obriga a todas as empresas de grande porte, que cobram estacionamento, terem um percentual de vagas para bicicletas.

Nós colocamos no orçamento para 2015, então não existe a desculpa de falta de verba, mesmo porque o investimento é muito pequeno. A importância maior da lei é incentivar as pessoas a utilizarem as bicicletas. Estatísticas mostram que, em Campo Grande, 150 mil pessoas utilizam bicicletas. E os perfis são bem definidos: os trabalhadores, especialmente os que trabalham nas indústrias que se localizam nas saídas da cidade, como alternativa de transporte.

E isso vem crescendo num ritmo acelerado.

E ai crescer cada vez mais, principalmente pela questão econômica, segundo porque é o único veículo que lhe permite economizar, cuidar da saúde, perceber melhor a cidade e se deslocar com rapidez. Cobramos até da Câmara a instalação do bicicletário, e já está sendo definido. Se estes instrumentos não forem suficientes, acionaremos o Ministério Público para que exigir o cumprimento da lei.

Aliás a Câmara não tem acessibilidade sequer piso tátil na calçada.

Como são dois pisos, nós temos até a estrutura elaborada para colocar o elevador, mas havia a desculpa de o prédio não ser propriedade pública. Agora que está definida esta questão, o próprio presidente [Mario Cesar] assumiu o compromisso de que vai deixar o local adaptado, colocar o elevador, piso tátil e rampas de acesso,

O senhor ainda utiliza o transporte público em determinados dias?

Sim. Eu não mantenho a frequência de uma vez por semana, mas a cada dez dias, ao menos, eu utilizo o ônibus.

Em relação à sua experiência com o transporte público urbano, o senhor tem denunciado o descaso do poder público na conservação dos terminais de transbordo, mas a lei que permitiu que o espaço de locomoção dos passageiros se transformasse num camelódromo, o senhor acha justo que uma pessoa que obedeceu todas as exigências legais e passou por uma concorrência, com todos os  custos que isso exige, ela concorra com pessoas que vendem alimentos sequer sem fiscalização sanitária?

Não, não é justo. Mas é importante lembrar que a lei não permite que fique como está. A lei aprovada pela Câmara Municipal não autoriza a ficar essa “bagunça”.

Vende-se também guarda-chuvas, quinquilharias, muamba, produtos contrabandeados...

A lei foi feita porque a legislação precisa acompanhar a dinâmica da cidade, da sociedade. A intenção da aprovação da lei foi, uma vez que todos os terminais já estavam tomados pelos vendedores ambulantes, com a conivência da Prefeitura, que fez vistas grossas, portanto, onde o poder público não chega e cuida, a sociedade toma conta, de um jeito ou de outro. Isso acontece com as praças, por exemplo, que se abandonadas vão se transformar em ponto de encontro de usuários de drogas, ou local de furtos. Com os terminais, ocorreu a mesma coisa. Os comerciantes informais tomaram conta aos poucos.

Então eles procuraram a Câmara, que fez audiências públicas, propôs esse projeto de lei, de autoria do vereador Coringa.

E aprovado por unanimidade.

Foi aprovado por unanimidade dentro da proposta de que se permita, mas que se regularize. Mais uma vez fica patente

Era para ter sido feita a regulamentação dessa lei, que não abre mão da fiscalização. A Prefeitura iria dizer, ou vai ter que dizer, que tipo de produtos ele pode vender, em qual horário e como deve ser organizado. Não é justo que os 230 mil usuários de pessoas que utilizam diariamente o transporte público, fiquem esbarrando nesses ambulantes que tumultuam os espaços de locomoção. Precisa ser regularizado.

Ai tem uma ineficiência do Executivo por não ter regulamentado e não estar fiscalizando, porque a lei não permite que eles fiquem de qualquer jeito.

O senhor como católico participante, com atuação na Ação Mariana, tem uma posição muito firme em relação à liberdade religiosa, em especial das religiões de matrizes brasileiras e africanas que, hoje, talvez sejam as mais discriminadas. Na sua visão, as administrações públicas, em face da maioria dos eleitores se constituírem de católicos e evangélicos,  têm avançado numa perigosa e inconstitucional linha de permitir influências religiosas em algo que deveria ser laico?

A religião e a política sempre caminharam de braços dados. As duas perseguem a mesma coisa, independente do que elas vendem de ideologia, as duas buscam a mesma finalidade, que é se manter no poder.

Evidente que muitas coisas se confundiram: a religião passou a intervir demais na política, e a política na religião.

Eu sou católico, cresci na igreja católica, mas sempre defendi a ideia de que uma coisa é a minha fé, as minhas ações privadas, outra coisa é as minhas ações públicas. Quando eu me disponho a ocupar um cargo público, qualquer que seja, sejam eletivas ou não, como o de um juiz, não é a minha vontade pessoal que tem que prevalecer.

Infelizmente a nossa sociedade tem se dividido em caixinhas. Então, o agronegócio cria sua bancada, os ambientalistas, outra, os evangélicos, a dos evangélicos, os católicos, a dos católicos, e assim por diante. Essa forma de divisão é muito ruim para a democracia, porque quando eu me rotulo em uma dessas caixinhas, eu assumo explicitamente todos os compromissos só com essa caixinha. Se eu sou um vereador eleito pela religião A, B ou C, eu vou ser cobrado por essa religião para que eu pregue as coisas que essa religião acredita, defende e considera positiva, o problema é que a sociedade não é feita só dessa religião. Quando a gente fala de recursos e políticas públicos, tem que abranger toda a sociedade. Eu posso até discordar da religião contrária, mas eu não posso discriminá-la, nem colocá-la à margem.

Eu posso até discordar da diversidade sexual, mas eu não posso discriminá-los em função de outra forma de relação. A política pública tem que pensar o Estado, como ele é. Eu costumo brincar dizendo que o político tem um comportamento na eleição, e outro no mandato. Na eleição, não importa se ele é evangélico, se tiver eleitor no terreiro de macumba, ele vai lá. Se tiver que ir em 50 igrejas das mais variadas denominações e credos, ele vai lá. Quando ele se reveste do cargo, ele esquece e diz que está ali por esta ou aquela bancada, quando na verdade ele deveria estar ali para representar toda a sociedade.

Eu defendo o Estado laico, porque é um princípio Constitucional, eu deixo claro que o político não pode confundir suas convicções pessoais com as coisas públicas.

E deve-se lembrar que, se for segmentar, em um colégio eleitoral de pouco mais de quinhentos mil votos, os vereadores representam, somados, algo em torno de cem mil votos.

Exatamente. Ai a gente tem que mudar a forma de representação, mudar a forma de escolha dos políticos, mudar uma série de coisas.

Quando nós discutimos a Quinta Gospel na Câmara Municipal, as pessoas perguntavam se nós estávamos contra os evangélicos.

Colocando como se uma posição do vereador a favor da laicidade fosse antagônica a uma determinada religião.

Não, pelo contrário, eu defendo tanto os evangélicos que eu quero que eles tenham espaço sempre. Agora, quero que todos os outros tenham o mesmo espaço, porque todos pagam impostos, votam, vivem nessa cidade e, tudo o que acontece nessa cidade, deve ser para todo mundo. A discussão não é contra um segmento, mas contra uma ação que exclui outros segmentos.

Já foi colocado pejorativamente que o vereador Eduardo Romero queria defender o pessoal da macumba. E não é essa a questão.

Ai teria que apresentar um projeto para os budistas, para os Santo Daime, para os luteranos...

Eu até falei, se a gente tiver que defender um dia para cada religião, faltarão dias no calendário. E não é esse o objetivo, o objetivo é respeitar todo mundo, da mesma forma.

Partindo para a seara política. A Câmara tem a maioria como base do prefeito Gilmar Olarte, e parece que tem sido complacente com erros cometidos pelos secretários e com o próprio atual prefeito. Também nos parece que ela agiu com rigor excessivo com relação ao prefeito anterior, Alcides Bernal, que não conseguiu maioria naquela Casa. O senhor que é da base, como tem visto isto?

Na verdade eu não diria que ela está fazendo vistas grossas para os erros do Gilmar e que ela está tratando o Gilmar diferente da forma como tratou o Bernal [Alcides Bernal]. Vou falar do PTdoB, partido do qual eu participo. Somos três vereadores, somos da base do Olarte, mas nós não ocupamos nenhuma função, embora existam dois filiados do partido que fazem parte da gestão, a Beth [Elizabeth Félix] da Agetran e o Cícero [Cícero Ávila] da Funsat, mas não foi indicação partidária, mas uma opção pessoal do prefeito, que fez o convite e ele foi aceito.

Mesmo sendo base e parte do grupo de apoio ao prefeito, nós não temos poupado críticas. Sempre que percebemos uma condição não condizente, criticamos, seja pelo microfone, seja por denúncia direta. Temos feito emendas em diversos projetos do executivo enviados para a Câmara.

Nessa comparação com o Bernal, nós temos que avaliar diversos elementos. Não existe um tratamento diferenciado. Com o Bernal, você tinha alguns elementos mais evidentes e mais palpáveis. Exemplo: você tinha uma investigação do Tribunal de Contas, uma do Ministério Público, e cartas de recomendação do Tribunal apontando falhas e recomendando que a Câmara se posicionasse. Você tinha uma CPI da Saúde, uma CPI do Calote, e depois uma Comissão Processante.

Do Gilmar, você tem tido inércia, inegavelmente. Não funciona como deveria funcionar, como seria bom funcionar, mas necessariamente não significa que não esteja funcionando só porque o Prefeito não quer.

Mas a questão do CEMPE foi irregular do começo ao fim, e nem por isso ele sofreu questionamentos.

É, desrespeitou o Conselho de Saúde.

Por menos que isso houve uma CPI da Saúde na administração Bernal.

Não, foi menos que isso.

Mas nós recebemos constantes denúncias de falta de medicamentos em postos de saúde...

Sim, concordo que tem uma série de situações inadequadas, agora, em relação ao CEME, a Câmara protocolou pedido, inclusive eu assinei, solicitando toda a documentação, toda a informação que é necessária para a gente poder avaliar todos os pontos. O papel da Câmara foi encaminhar essa documentação ao Ministério Público, e ao Tribunal de Contas, e até agora não tivemos nenhum posicionamento.

O vereador fica numa instância muito difícil. Nós somos agentes fiscalizadores, mas com poderes muito limitados. A gente depende muito de órgãos auxiliares, no caso o TCE e o MPE, para que nos deem os subsídios do que a gente pode e do que não pode.

É claro que hoje, com o número de vereadores da base e com a relação de diálogo que o Gilmar tem com a Câmara, facilita. Com o Bernal, você não conseguia discutir nada. Além de não ter o diálogo, mesmo solicitando documentos você não conseguia ser atendido.

Infelizmente nós não temos na Câmara esse poder de, a todo momento, dizer se está certo ou está errado, o instrumento que temos é o microfone. E se esse microfone não estiver na imprensa, não estiver no judiciário, fica restrito à Casa.

O meu poder como vereador é encontrar as coisas que considero certas ou erradas, as que estiverem certas, OK, as que eu julgar que estão erradas, o máximo que eu posso fazer é, além de usar o microfone, encaminhar ao Ministério Público. Eu fico refém porque se não tiver um parecer concordando ou discordando daquilo que foi apresentado, como possível irregularidade, eu não tenho como fazer.

E essa morosidade do Executivo, do Legislativo e do Judiciário faz com que caia no esquecimento uma série de denúncias.

É, por vezes a gente perde muito tempo. A morosidade não é pela vontade, é pelo trâmite, pelo volume.

O senhor foi sondado por diversos partidos que se formaram, ou se formalizaram, após as eleições. O senhor preferiu continuar no PTdoB, que é um partido tido como pertencente ao ex-governador André Puccinelli. O que lhe fez manter essa fidelidade partidária?

Primeiro que nós do PTdoB ficamos muito irritados quando nos chamam de peemedebezinho. Isso é uma discussão interna constante. Historicamente o partido criou essa afinidade com o PMDB porque desde que veio para Mato Grosso do Sul, sempre caminhou ao lado do PMDB. Nas falas do governador, ele dizia que considerava o PTdoB como o peemedebezinho. Isso na prática só nos trouxe revezes. O PTdoB criou uma imagem que não é do PTdoB, nós não somos um partido do André e nem somos um peemedebezinho. Somos o PTdoB, um partido com três vereadores na Capital, dois prefeitos no interior, vice-prefeitos, dois deputados estaduais, temos representação federal.

Mas a sobrevivência matemática de um partido lhe mostra que você não consegue fazer representações. O que faz um partido ser forte é o número de cargos eletivos que tem.

Eu me mantenho no PTdoB porque não tenho nenhum problema com o partido. Discordo de uma série de questões, o que é normal e salutar a divergência em todos os partidos. É uma agremiação que precisa estar o tempo todo encontrando caminhos e identidades. Recebi sim convites de vários partidos, alguns até que estavam ainda pensando em se oficializar, e me mantive porque não tinha nenhum motivo específico para sair do PTdoB. O partido me dá liberdade, tanto que o perfil dos três vereadores da Capital pelo partido, são bem diferentes. Tem momentos em que votamos diferente, fazemos debates diferentes.

Eu disputei minha primeira eleição pelo PV, fiquei na suplência. Não me mantive no partido porque lá eu fiquei desconfortável. A forma como conduziam o partido em Mato Grosso do Sul, eu não concordava.

Sabemos que cada vez mais o eleitor não está ligado à sigla partidária, ela está ligada ao seu histórico, ao seu trabalho. Só que você não disputa uma eleição sem partido.

Com 32 partidos políticos e mais 6 em fase de registro...

É muito partido, precisamos de uma reforma política. Os estatutos dos partidos se repetem. São basicamente cópias um do outro.

E geralmente desconhecidos pelos próprios filiados.

Exatamente.

Encerrado o segredo de Justiça do caso da investigação do MPE por meio do Gaeco, e que envolve o prefeito Gilmar Olarte e outros, o senhor pode falar dos motivos que levaram os três vereadores do PTdoB  a serem chamados a depor?

Posso e, aliás, a gente sempre falou, mas não podíamos dar detalhes.

O que ocorreu especificamente é que nesse processo nós fomos citados numa conversa entre o Prefeito e uma pessoa que eu não sei dizer quem é. Essa situação nos levou como testemunha. Nós fomos, de uma forma grosseira, intimados, e digo isso porque o Gaeco não precisava fazer aquele espetáculo midiático, e nós manifestamos isso ao promotor, discordando da forma como foi feito o processo da intimação. O processo era: testemunhas dentro da investigação que estava se fazendo.

Fomos chamados porque numa escuta específica a respeito dos investigados foi citado o PTdoB.

Ligado ao suposto recebimento de valores pelos vereadores?

Não dizia nada mais do que assim: Conversou com o pessoal do PTdoB? Era essa a citação. Por esse motivo os três vereadores foram ouvidos. Não sei dizer porque só o PTdoB foi convocado. O promotor que nos atendeu disse que todos os vereadores seriam ouvidos. Nós começamos pelo PTdoB porque vocês foram citados. Depois não houve mais intimações e o PTdoB ficou com o peso maior disso.

Nós tivemos, inclusive, uma declaração por escrito do promotor Marcos Alex, atestando que nós estávamos no processo apenas como testemunhas, em documento oficial, após nosso testemunho. Só que ficou ruim, por ter sido o único partido a ser chamado. De nossa parte não houve nenhuma preocupação, tanto que antecipamos nossa ida.

Não pudemos falar porque fomos orientados de que corria em segredo de Justiça, e nem nós sabíamos do teor das investigações.

Em se comprovando as acusações que o Ministério Público fez ao prefeito Gilmar Olarte, haveria algum problema em trocar de prefeito, novamente?

Se isso for necessário, e for o caminho, não tem problema. Essa troca não é simplesmente tira um prefeito e coloca um prefeito. Eu digo que eu me tornei vereador no momento em que o caldeirão estava fervendo. Aumentou o número de vereadores de 21 para 29, e já havia uma resistência a este aumento de cadeiras,  depois foi o momento de um prefeito eleito e que não era o favorito e que quebrou a hegemonia de um grupo, mas não dialogou com nenhum dos segmentos, e depois de uma série de acontecimentos, foi cassado. O prefeito que assumiu, que alguns chama de biônico, porque não foi eleito, mas na minha opinião ele foi, porque era o vice, e a gente vota na chapa completa. Ai a gente pega uma prefeitura que vinha numa crescente, com índices de 15% ao ano e a gente cai para 3 ou 4%. Tinha convênios federais, e eles são perdidos. Caímos no Ideb e viramos matéria nacional de falta de merenda, prefeitos Olarte e Bernal; escolas sem manutenção, prefeitos Olarte e Bernal; operação tapa buracos onde não haviam buracos, e a demora em dar respostas gera questões e dúvidas que nos projetam nacionalmente. Depois aparecemos como destaque negativo na questão do desvio do seguro-desemprego.

Vemos, então, só as imagens negativas de nossa cidade sendo projetadas nacionalmente. Eu estou vereador num momento em que tanta coisa ruim está acontecendo. Mas você está e tem que estar atento a essa questão.

Eu diria que todo esse cenário gera uma instabilidade política. As pessoas hoje falam de uma cassação com muita naturalidade: Ah, se não estiver bom, troca. Mas não é bem assim, tem todo um rito que deve ser seguido.

Hoje, eu diria que, conceitualmente qualquer um tem a chance de ser cassado, um vereador, um prefeito. Basta cometer um deslize grave. Neste momento, nós não temos elementos concretos. Tem muita especulação e muito termômetro. Mas não temos nenhuma denúncia específica do Ministério Público.