16 de abril de 2024
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Ex-desembargador é condenado a 8 anos de prisão por propina de banco e perde 15 imóveis

A sentença do juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira foi publicada no Diário Oficial desta quinta-feira (14)

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A 3ª Vara Federal de Campo Grande condenou um ex-desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região e um advogado por lavagem da propina de R$ 1,5 milhão paga pelo Banco Bamerindus. Além de cumprir quase nove anos de prisão, o ex-juiz perdeu 15 apartamentos em Campo Grande, que serão destinados para a União.

A sentença do juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira foi publicada no Diário Oficial desta quinta-feira (14). É a segunda pena aplicada no escândalo, já que a primeira resultou na condenação a três anos por corrupção e a perda do cargo de desembargador.

Ex-desembargador do TRF3, Paulo Thetônio Costa foi condenado a oito anos, oito meses e 29 dias de prisão em regime fechado por lavagem de dinheiro. Ele ainda perdeu 15 apartamentos no Condomínio Morada dos Pássaros, no Bairro São Francisco, e pagará 216 dias-multa, equivalente a quase R$ 70 mil.

Além do ex-magistrado, o advogado Ismael Medeiros foi condenado a quatro anos, três meses e 19 dias em regime semiaberto.

Conforme a denúncia, o então desembargador do TRF3 recebeu propina milionária para segurar uma ação do Bamerindus contra o Banco Central, que cobrava R$ 150 milhões. Com a decisão, o falido banco paranaense teve prioridade entre os credores do Grupo Econômico, liquidado pelo Banco Central.

O pagamento da propina foi feito por meio da contratação de Medeiros, advogado iniciante de Cassilândia (MS) e amigo de infância do irmão do magistrado. Ele recebeu R$ 1,5 milhão em dinheiro vivo sem prestar serviço ao banco.

“Primeiramente, com todo o respeito ao ilustre profissional Ismael, advogado sul-mato-grossense da pacata Cassilândia/MS, cidade de nascimento de Paulo Theotônio Costa (fl. 14, vol. 1), as instituições financeiras de grande porte possuem quadros de advogados e corpos jurídicos em suas próprias estruturas empresariais. Quando porventura não fazem uso de seus corpos jurídicos e contratam escritórios terceirizados, corriqueiramente o fazem para ter nada menos do que os maiores escritórios de advocacia do país, especializados em matéria societária, falimentar ou tributária”, observa o juiz, sem esconder o espanto.

“Ao contratar advogado de fora do quadro, o Bamerindus optou logo por Ismael, cujos serviços advocatícios não têm qualquer registro de elaboração intelectual no contexto ad judicia, nem há prova de reuniões com departamento jurídico do Bamerindus; há tão somente a informação de que, na ação que julgava o crime antecedente de corrupção, disse Ismael ter contatado o Bamerindus através de um executivo do banco para expor-lhe a sua tese jurídica, exatamente aquela que permitiu a compensação suspeita e, por isso, foi contratado”, observou.

Como não tinha endereço residencial nem comercial em São Paulo, Ismael indicou como local a casa de uma funcionária de Costa e esposa de outro desembargador federal, que também acabou punido pelo esquema criminoso.

Após receber R$ 1,5 milhão do Bamerindus, conforme o Ministério Público Federal, Ismael simulou empréstimo de R$ 1,014 milhão para as empresas de Paulo Theotônio, a Kroonna Construção e Comércio e Thema Empreendimentos, Participação, Incorporadora, Construção e Comércio. O suposto empréstimo ocorreu entre 1997 e 1999.

“Afinal, está para além de qualquer casualidade que dinheiro tenha sido entregue a Ismael, e, então, às empresas de Paulo Thetônio. E esse percurso houve como uma mera simulação, referenciada ao pagamento de vantagem injustificável”, analisa Teixeira.

Com o dinheiro, o desembargador teria investido no conjunto de edifícios Morada dos Pássaros, que  contou ainda com financiamento de R$ 3,6 milhões da Caixa Econômica Federal. Conforme a denúncia, o desembargador ficou rico do dia para a noite.

“A condenação de ambos os acusados com relação à lavagem de ativos concernentes à realização de empréstimos simulados e da construção do residencial Morada dos Pássaros, ocultando e dissimulando a origem criminosa dos recursos. Paulo, conforme a descrição do órgão de acusação, apresentou patrimônio milionário na noite para o dia e, em sendo agente público, com pagamento certo, precisava se valer de algum mecanismo para receber o dinheiro”, pontua na sentença de 44 páginas.

Esta é a segunda sentença pública do caso envolvendo o ex-desembargador. Paulo Thetônio Costa foi afastado do cargo no TRF3 em 2003 e condenado a três anos e a perda do cargo por corrupção em 2 de outubro de 2008.

Somente em 12 de abril de 2013, após a sentença transitar em julgado, o TRF3 publicou a exoneração do magistrado. Em caso raro no Poder Judiciário, ele não foi aposentado compulsoriamente e ainda foi obrigado a devolver os subsídios pagos depois da condenação.

Como o juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira não decretou a prisão preventiva, porque houve colaboração com a Justiça, o ex-desembargador só iniciará o cumprimento da pena após o caso transitar em julgado.

Ismael teve pena menor porque acabou colaborando com a Justiça. Ele confessou que conheceu o então magistrado em um almoço na casa do amigo de infância. Costa ofereceu o serviço do Banco Bamerindus. Ao chegar a São Paulo para a reunião com a instituição financeira, ele encontrou apenas o desembargador, que lhe entregou a petição pronta e somente para ser assinada.

No processo, Paulo Theotônio Costa alegou cerceamento da defesa porque a Justiça não autorizou perícia contábil nas construtoras nem autorizou a quebra do sigilo do antigo banco.

A denúncia de lavagem de dinheiro na compra da Fazenda Rio Negro por R$ 500 mil em 1998 acabou arquivada por falta de provas e porque o outro réu acabou salvo pela prescrição devido a idade avançada.

A condenação de juízes vem sendo algo inovador no Poder Judiciário brasileiro, marcado pelo corporativismo. Na esfera federal, o juiz aposentado Jail Azambuja cumpre pena no Presídio Militar de Campo Grande, onde passa as noites, já que sai de dia para trabalhar como advogado.

Na esfera estadual, a desembargadora Tânia Garcia de Freitas Borges está afastada do cargo e respondendo a dois procedimentos abertos no Conselho Nacional de Justiça.

O Tribunal de Justiça abriu procedimento contra uma juíza do interior do Estado, que não teve o nome divulgado, mas teve desembargador defendendo a sua aposentadoria compulsória devido a gravidade dos fatos.

Outro juiz afastado é Aldo Ferreira da Silva Júnior por suspeita de corrupção na 5ª Vara de Sucessões e da Família na Capital. Ele ainda é investigado por participação no golpe de R$ 5,3 milhões, supostamente aplicado pela esposa, a advogada Emmanuelle Alves de Araújo, que chegou a ficar 45 dias presa no ano passado.