23 de abril de 2024
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DECISÃO JUDICIAL

Professor é condenado a 46 anos de prisão por estuprar afilhada em MS

Ex-presidente do Conselho de Saúde de MS, ex-dirigente partidário e influente na Fetems, padrinho está preso desde 22 de fevereiro de 2021

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O professor de geografia Florêncio Garcia Escobar, de 55 anos, acusado de estuprar a afilhada desde que ela tinha 8 até ela completar 18 anos. E acusado de estuprar a irmã dela dos 12 aos 15 anos, em Aquidauana (MS), foi sentenciado a 46 anos e 8 meses de prisão em regime fechado. O homem está preso desde 22 de janeiro de 2021. Os estupros teriam ocorrido entre 2010 e 2020. 

Em entrevista ao MS Notícias, no sábado (27.nov.21), a dona de casa de 38 anos, mãe das vítimas, celebrou a vitória. — Estamos muito felizes com o resultado. Com o apoio da população, dos jornais, da mídia em si [...]. Até porque a gente achava que não iria dar em nada, pelo fato de ele ter dinheiro, de ele ser uma pessoa conhecida, popular, ter vários cargos. As minhas filhas estão aliviadas, teve a justiça que a gente esperava [...]. Agora no dia 7 de dezembro faria 1 ano que eu fiz a denúncia. Elas estão realizadas com a justiça, estão aliviadas, porque foi feito justiça. [Diferente] De outros casos que pela pessoa ter condição social melhor não paga pelo erro que fez, né? Mas ele vai pagar, graças a Deus, graças a nossa Justiça — disse a mãe, confirmando a decisão.  

A mãe ainda agradeceu o Coletivo AquiMulher de Aquidauana. — Agradecida a toda a sociedade, as meninas do Mulheres de Aquidauana Pedem Justiça, foi muito fundamental para gente, que conseguiu médico, psicólogo, psiquiatra para nossas filhas, a gente está muito feliz. A gente só tem a agradecer ao nosso advogado, doutor André [André Lopes Béda] — finalizou.

DENÚNCIA

O professor foi denunciado pelo Coletivo, em reportagem publicada em 11 de janeiro de 2021 no MS Notícias. Além das irmãs, uma terceira vítima foi à Delegacia da Mulher de Aquidauana (DAM) e denunciou que havia sido estuprada, na época a mulher disse que foi vítima quando tinha apenas 15 anos. A mulher, porém, só denunciou o caso 24 anos mais tarde, após a denuncia da afilhada ganhar força. 

Quando ocorreu a 3º denúncia em desfavor de Florêncio — ele já estava sendo acusado há mais de mais de um mês pela afilhada, porém, na época, vinha sendo poupado por alguns veículos de comunicação, devido a influência política e poder financeiro que tinha. Florêncio era diretor-presidente no Conselho Estadual de Saúde de MS, exercia cargo na Fetems, atuava na CUT e era liderança partidária do Partido dos Trabalhadores em Aquidauana.

A Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (Fetems), na qual Florêncio era Secretário de Políticas Municipais, antes mesmo da reportagem, emitiu nota sobre a acusação comunicando o afastamento do professor em 4 de janeiro de 2021.

Florêncio também era Secretário de Administração e Finanças da Central Única dos Trabalhadores do Mato Grosso do Sul (CUT-MS). A entidade também emitiu nota comunicando o afastamento do suspeito em 5 de janeiro de 2021. 

Todas as entidades às quais pertenciam o acusado, se posicionaram apenas 1 mês após a denúncia, e só devido à força que ganhou o boletim divulgado nas mídias sociais. Essa foi a avaliação das mulheres aquidauanenses que acompanharam a situação na época.

CRONOLOGIA

O caso saiu em reportagem no dia 11 no MS Notícias. Daí em diante a vida do professor mudou radicalmente.

Menos de 24h após a reportagem ir ao ar, ele "pediu afastamento" do cargo de presidente do Conselho de Saúde. Florêncio disse no dia 12 de janeiro, em documento, que estaria deixando o cargo “por motivos pessoais”. A entidade comunicou o afastamento de Florêncio no dia 13, mas eles alegam que ele já estava desligado do órgão desde 8 de janeiro.   

Em 15 de março de 2021 o governador Reinaldo Azambuja publicou a exoneração de Florêncio. 

Em 22 de janeiro à noite o professor de geografia foi preso em cumprimento do mandado deferido pela Justiça, após pedido da delegada titular da Delegacia de Atendimento à Mulher (DAM), Joice Ramos. No dia 25 de janeiro ele passou por audiência de custódia, mas permaneceu em silêncio. A Justiça determinou no mesmo dia a prisão preventiva. Os investigadores apontaram que devido a influência, Florêncio estaria coagindo testemunhas. 

O professor tentou habeas corpus, mas o pedido de liberdade foi negado em abril, conforme divulgado no Diário Oficial da Justiça da terça (27.abr.21).

Em 1º de junho foi acatado o pedido à Justiça para a transferência de Florêncio para o presídio militar de Campo Grande, a decisão saiu no diário oficial, compreendendo que o acusado tem nível superior de formação. Desde então, Florêncio aguardava o julgamento.

O Partido dos Trabalhadores, onde Florêncio era dirigente em Aquidauana, disse que aguardava a decisão judicial para decidir pela expulsão do acusado da sigla. Ele estava coligado ainda em outubro, quando o MS Notícias mostrou que Florêncio segue sendo remunerado mensalmente em mais de R$ 15 mil pelo Governo de MS, mesmo estando preso. A Lei diz que somente após a sentença proferida que ele poderá ser exonerado. 

COMO AGIA

Após a prisão de Florêncio ser mantida, a mãe das vítimas aceitou dar entrevista ao MS Notícias em 26 de abril, ocasião em que a genitora detalhou como o crime cometido por alguém que ela “considerava um pai” devastou a vida das filhas. — Parece que os dias vão passando e tudo vai piorando. A [vítima] de 18 anos está com problemas diversos. Elas estão tomando remédios controlados... está sendo tudo, tudo mesmo, muito difícil! Esses dias ela veio de Campo Grande aqui para Aquidauana e me disse que não está conseguindo dormir e, quando conseguia dormir, acordava tendo que falar sobre isso. Ela me conta que tudo isso machuca muito, ter que estar falando sobre isso — apontou a dona de casa, que na ocasião, aconselhou a filha a ser forte nesse momento até que o acusado fosse punido.

Ao longo dos 8 anos que teria abusado da menina, Florêncio sempre esteve bem perto, controlando tudo. Sua aproximação começou justamente em um momento de fragilidade, dia em que a mãe das meninas sepultava o avô delas.  — Eu o tinha como um porto seguro, me ajudava e tinha acesso a tudo. Ele participou do velório do meu pai. Foi quando começou a se aproximar da minha família. Era uma confiança imensa que eu tinha nele — analisou. Veja AQUI a entrevista completa

A reportagem falou o advogado André Lopes Béda para confirmar a decisão.  — Ainda teremos a segunda instância para trabalhar e como o processo corre em segredo de Justiça não poderia dar maiores detalhes sobre a condenação, mas, as informações estão corretas  — explicou.  

OUTRO LADO

O advogado de defesa Samuel Chiesa, disse ao MS Notícias que não teve acesso a decisão judicial. “Não foi publicada ainda, então não posso dar um posicionamento claro”, explicou. Perguntado se recorreria a decisão, porém, Chiesa afirmou que sim. “Confiamos na inocência do Florêncio. Vamos recorrer sim”, disse.

*Reportagem alterada às 14h50 desta segunda (29.nov.21) para acréscimo de informações.