Na mentira que inventaram contra Lula nesta sexta, 10.abril, usando o inventário de Marisa Letícia, morta em fevereiro de 2017, os filhos de Jair Bolsonaro apenas se usaram de um velho boato já desmentido sobre a mulher do ex-presidente: 'o de que Marisa ganhou milhões como vendedora da Avon'.
A fake news foi espalhada outras vezes e nas ocasiões também já teria sido desmentida, como mostra essa matéria do site Boatos.Org.
Na eleição de 2018, e quando ficou provado – isso, sim, é verdade – que Michelle Bolsonaro, mulher de Jair, recebeu depósitos do miliciano Fabrício Queiroz, que comandava susposto esquema de corrupção e funcionários fantasmas de Flávio Bolsonaro, então deputado estadual pelo Rio de Janeiro, o assunto foi viralizado.
O nome de Michelle apareceu, em dezembro, como receptora de 24 mil reais depositados em sua conta pelo ex-PM Fabrício Queiroz, amigo do clã Bolsonaro, o ex-capitão perdeu o chão e assumiu a bronca toda para ele. Na ocasião Bolsonaro se irritou, observou que não tinha nada haver, que se tratava de um empréstimo sem notas e que Fabrício estaria pagando a dívida.
Segundo contou à época, em uma conversa a portas fechadas, um advogado que era do time de defensores do atual presidente. Imagine-se o transtorno de Bolsonaro agora que o Ministério Público (MP) do Estado do Rio faz uma devassa financeira na família Queiroz, em um caso que tem tudo para transformar em inferno a vida do primogênito do presidente, Flávio, senador pelo Rio.
Queiroz e Flávio tiveram os sigilos bancário e fiscal quebrados no fim de abril por ordem judicial, a pedido do MP. Será que os dados do ex-PM, funcionário por uma década de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, revelarão outros depósitos para Michelle? Os 24 mil caíram na conta dela em algum momento entre 2016 e 2017, conforme um relatório de 2018 do Coaf, o órgão federal de vigilância de transações bancárias suspeitas. Bolsonaro dizia em dezembro que se tratava de parte da liquidação de um empréstimo de 40 mil que ele havia feito a Queiroz. O depósito havia sido em favor da esposa, pois Bolsonaro afirmava que não tinha tido tempo de ir ao banco sacar a grana da própria conta.
Explicações estranhas. O ex-capitão não podia usar a internet, território onde deita e rola politicamente, para realizar movimentações bancárias com os recursos repassados por Queiroz? Por que precisava de 24 mil em dinheiro vivo?
Embora seja o responsável por aproximar, no passado, seu primogênito de Queiroz, um velho amigo de pescarias e churrascos, Bolsonaro tentou desvincular-se da dupla. Em janeiro, comentou, a propósito dos aparentes rolos de Flávio enquanto deputado estadual: “Se por um acaso ele errou e for provado, eu vou lamentar como pai, mas ele terá que pagar”, disse o presidente na ocasião se isentando de qualquer responsabilidade.
Mas não pode agir da mesma forma em relação a Michelle. Se ela foi usada por Queiroz como canal financeiro com o clã, foi no interesse do presidente e com o conhecimento do próprio. A eventual descoberta de outros depósitos do ex-PM na conta da primeira-dama poderia levar os promotores a pedir a quebra de sigilos dela. Em janeiro, a Receita Federal abriu uma investigação fiscal sobre Michelle, com base naquele relatório do Coaf que detectou a vida bancária suspeita de Queiroz. Um mês antes, Bolsonaro reconhecia não ter declarado ao Fisco a renda obtida com o alegado empréstimo quitado pelo ex-PM.
Já naquela época foi inventada a mentira sobre os milhões atribuídos a Marisa terem sido amealhados como vendedora da Avon. O caso de Michelle desapareceu dos arquivos judiciais e nada mais foi comentado sobre as acusações.
Bolsonaro e Michelle evitam falar do caso. Durante todo esse período, o presidente se limitou a dizer que o dinheiro era para ele, e não para a primeira-dama, e que se tratava da devolução de um empréstimo de R$ 40 mil que fizera a Queiroz. Alegou não ter documentos para provar o suposto favor, no valor de um automóvel zero quilômetro, modelo básico.
Em revés, os filhos de Bolsonaro usam a mentira contra Marisa para manter oculta a verdade do caso Michelle Bolsonaro.
MAIS DE UM ANO DEPOIS, 15 PERGUNTAS SEM RESPOSTA
Desde 20 de dezembro de 2019, o UOL tentava entrevistar o presidente, Michelle ou seus representantes. Perguntas como estas permanecem sem nenhum esclarecimento:
Quando o presidente fez o empréstimo a Fabrício Queiroz?
Qual o valor exato do empréstimo?
O empréstimo foi dado a Queiroz de que maneira? Em dinheiro em mãos? Em conta bancária? Em algum tipo de bem?
Os R$ 40 mil foram entregues à vista a Queiroz?
Se o valor foi emprestado parceladamente, quando foram as datas desses créditos?
Haveria algum comprovante - qualquer que seja - do crédito do empréstimo do presidente Jair Bolsonaro para Queiroz?
Por exemplo, uma anotação em agenda, depósito em conta bancária, declaração à Receita Federal, e-mail, mensagem de WhatsApp ou canhoto de cheque? Por quê?
Quando Queiroz começou a pagar o empréstimo de volta?
Quando Queiroz terminou de pagar o empréstimo?
Parte desses pagamentos de Queiroz foi feita em espécie? Em bens? Em outras contas bancárias?
O presidente saberia recordar qual o valor e data dessas outras formas de pagamento?
Haveria algum comprovante, qualquer que seja, da devolução do empréstimo, feita por Queiroz para o presidente Jair Bolsonaro?
Desde que o empréstimo foi realizado ou pelo menos desde 2018, quando as primeiras informações foram divulgadas, o presidente Jair Bolsonaro prestou alguma informação ou deu algum depoimento a autoridades sobre isso? Quando?
Para quem? Polícia Civil? Polícia Federal? Ministério Público Estadual ou Federal? Receita Federal? O que foi dito?
Desde que o empréstimo foi realizado, a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, prestou esclarecimentos às autoridades? Quando?
Para quem? Polícia Civil? Polícia Federal? Ministério Público Estadual ou Federal? Receita Federal? O que foi dito?