O voto do eleitor campo-grandense em 2012 está no banco dos réus. E não por culpa do eleitor, que ao escolher o nome de Alcides Bernal (PP) para prefeito acreditou estar promovendo uma mudança positiva, certamente movido pelo desejo de buscar uma nova alternativa ao modelo gerencial que já tinha mais de duas décadas. Bernal não soube aproveitar o desgaste a que foram submetidos seus antecessores e passa ao largo do vácuo que poderia ser seu melhor, mais seguro, aprazível e confortável espaço político, a ponto de iniciar um novo ciclo hegemônico para ele próprio liderar.
Em 14 meses de mandato, o prefeito que foi consagrado com mais de 270 mil votos não conseguiu agradar sequer o imenso contingente de eleitores que foi duas vezes às urnas sufragar seu nome. Se ainda estiver em boa conta ou no crédito de confiança de um décimo desse contingente, terá sido uma proeza. Cavou seu próprio buraco e não parou um instante de afundar-se, surdo aos apelos de amigos e aliados que cansaram de esgoelar apelando para que reavaliasse seu modo de agir, errando nas decisões e sobretudo na ausência delas.
Os erros na administração foram reflexo direto e implacável dos erros na política e ambos da errática relação entre o homem, o político e sua incapacidade de examinar a si mesmo, para fazer uma autocrítica corajosa e sincera até constatar que não é o centro do mundo e que muita gente pode pensar junto e contribuir em sua caminhada. Porém, ele referiu o escapismo de só ouvir a si e remeter as críticas ao baú da vitimização, colocando num mesmo saco os inimigos, os adversários e os amigos e aliados que, em vão, tentaram abrir seus olhos.
ISOLAMENTO – Sem nenhuma ação concreta que pudesse fixar efetivamente e de forma diferenciada sua marca pessoal, a administração municipal vem aos solavancos, opaca e tropeçando em, erros primários por falta de formulação e de planejamento, sem interatividade ampla com os agentes sociais e prejudicado pela dicotomia entre o que não se faz e o que não há para aproveitar de maneira contundente por meio da mídia oficial. Mais de um ano de gestão e Bernal não foi além de alguns remendos.
A cidade sofre com a falta de investimentos e os cidadãos já sabem que a responsabilidade é de um prefeito que perde recursos porque não soube construir uma relação eficaz e dinâmica com parceiros fundamentais para canalizar projetos e acelerar a abertura das torneiras dos cofres federais e estaduais. Nas áreas de saúde e educação repetem-se as mesmas queixas que eram atribuídas à gestão de seu predecessor, o peemedebista Nelson Trad Filho. A diferença é que na gestão de Nelsinho as diferenças políticas e pessoais não o impediram de ter o auxílio de parlamentares e lideranças de oposição para garimpar verbas federais e conduzir sem sobressaltos a relação com o Poder Legislativo.
ENFIM...NADA - Já entrando na reta final de seu primeiro ano de governo, e todo esse tempo alheio ao conteúdo de críticas certeiras e menosprezando o potencial contributivo de partidos e políticos que o apoiaram no segundo turno, Bernal entrou de vez em choque com a Câmara, lançando o mote “Deixem o Homem Trabalhar”. Até então, no entanto, nada havia de tão grave que o deixasse de mãos amarradas. A imobilidade crônica de seu governo não era e não é produto das críticas ou da oposição.
Quando decidiu chamar o suplente de senador Pedro Chaves para preencher um espaço vazio de sua gestão, o da coordenação política, Bernal fez a sociedade e seus aliados de primeira hora acreditarem que, enfim, havia cedido ao bom-senso. Até parte da oposição, por meio de alguns vereadores, ensaiou aproximar-se mais e, inclusive, acenando fazer parte da sua base de sustentação. Ledo engano.
O articulador político Pedro Chaves viu sua função de secretário de Governo esvaziada pela indiferença quase humilhante de um prefeito que raramente o consultava. Eram contadas nos dedos as vezes em que Bernal chamava e ouvia o vetusto Chaves para conversar e traçar diretrizes gerais e específicas das administração, cuidar das sugestões e reclamações de secretários, vereadores, dirigentes e demais interlocutores. O jeito distante e centralizado de governar afetou sensivelmente o desempenho de sua própria equipe.
SEM VOLTA - Quando a crise com a Câmara chegou ao vermelho, nem assim o principal gabinete da prefeitura acendeu o sinal vermelho. A instalação da Comissão Processante chegou a ser vista, em princípio, como um torpedo político pré-estabelecido pelos oposicionistas. Bastou a questão entrar na pauta do Judiciário para a inabilidade política do prefeito decretar seu isolamento. Nem mesmo a tentativa heroica de Chaves para melhorar as relações com a Câmara e ampliar a base de Bernal foi suficiente. Não por demérito de Chaves, que fez o encaminhamento correto, mas o prefeito agravou sua situação no processo ao apostar que alguns recursos vitoriosos em instâncias locais implodiria a Processante.
Sem a suspeita natural de aliados que desconfiam de interesses paroquiais para contaminar as decisões do Judiciário em Mato Grosso do Sul, a CP foi resgatada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Decisão jurídica e judicial consolidada, resta à Câmara fazer sua parte, julgando com isenção e responsabilidade o presente e o futuro de um prefeito e, mais importante, de um município que se aproxima de seu primeiro milhão de habitantes e está há um ano e dois meses claudicando nas pernas inseguras e lentas de uma administração manca.
A Câmara votará nesta quarta-feira se cassa ou não o prefeito. Dos 29 vereadores, é muito sugestiva a previsão de que apenas cinco estariam comprometidos a votar a favor de Bernal, que precisa de um mínimo de dez votos para salvaguardar seu mandato. Os três vereadores petistas (Marcos Alex, Zeca do PT e Airton Araújo); a pepessista Luíza Ribeiro; e o pepista Cazuza devem defender galhardamente o compromisso com a coerência e a trincheira política que ocupam, mesmo cientes dos equívocos de Bernal. Os demais 24 vereadores – à exceção, talvez, de um ou dois indecisos - estão propensos a devolver o prefeito à condição de cidadão comum.
Se Bernal for cassado agora, não mais se irá configurar violência contra seu mandato ou contra a vontade dos quase 271 mil eleitores que o ungiram em outubro de 2012 para governar quatro anos. Com a soma do que fez de errado e do que não fez para tentar acertar, ele escreveu sua própria crônica da morte política anunciada.
Edson Moraes, especial para MS Notícias