29 de março de 2024
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Política

Em meio à pandemia, gestores denunciam defasagem no atendimento a pessoas com deficiência

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Gestores de instituições que atendem pessoas com deficiência denunciaram uma série de defasagens financeiras, tecnológicas e de procedimentos que dificultam a qualidade e a extensão dos serviços prestados. O tema foi debatido nesta terça-feira (20) em audiência virtual conjunta das Comissões de Seguridade Social e de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
Audiência Pública - Debate sobre a Tabela de Custos dos Procedimentos, Medicamentos e OPM. Superintendente da Associação Fluminense de Reabilitação, representando a Associação das Instituições do Terceiro Setor de Niterói, Telmo Silva Hoelz
Telmo Hoelz: "Estamos recebendo muita demanda e casos dramáticos; a coisa está muito séria"

Segundo os participantes da audiência, a situação tem se agravado diante do crescente quadro de pessoas que tiveram Covid-19 e hoje apresentam sequelas funcionais, neurológicas e cardiorrespiratórias. Diante da série de problemas, os deputados articulam a criação de um grupo de trabalho para cobrar soluções efetivas por parte dos ministérios da Saúde, da Economia e da Mulher, Família e Direitos Humanos.

Tabela do SUS
O debate principal era em torno da defasagem da tabela de custos que serve de base para o Sistema Único de Saúde pagar as instituições conveniadas por procedimentos, medicamentos e a chamada OPM, ou seja, o uso de órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção dos pacientes. Alguns itens não têm reajuste há 17 anos e acumulam defasagem superior a 100%. A coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa das Pessoas com Deficiência, deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), citou, por exemplo, o impacto dessa defasagem na Associação Pestalozzi que atende a região metropolitana de Maceió.

"Atualmente, já não se consegue dispensar alguns dispositivos como cadeira de banho com encosto reclinável, cadeiras tetraplégicas, muleta axilar, bengalas articuladas e de quatro pontas, prótese ocular, entre outros, o que gera falta de inclusão e desrespeito ao direito de assistência à saúde de forma integral", apontou. "É angustiante uma fila de mais de 70 pessoas esperando uma prótese auditiva, da criança até o idoso."

As instituições informam que o SUS paga R$ 1.170 por uma cadeira tetraplégica, que tem valor de mercado de R$ 2.500. No caso da muleta axilar, a tabela-SUS prevê R$ 53, enquanto o valor correto seria de R$ 150. A diferença é grande também na prótese ocular: R$ 283 pelo SUS e R$ 1.500 no valor de mercado.

Consultas e cirurgias
Superintendente de Operações da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), Emanuel Toscano citou elevada defasagem também no valor transferido pelo SUS para consultas médicas, reabilitação e procedimentos cirúrgicos. Reclamou ainda da falta de atualização de equipamentos e procedimentos que avançaram diante das novas tecnologias. O superintendente da Associação Fluminense de Reabilitação, Telmo Hoelz, cobrou urgência de recursos diante do atual aumento de demanda de pessoas com inúmeras sequelas deixadas pela Covid-19.

"Estamos recebendo uma demanda constante e casos dramáticos estão chegando às nossas instituições. Uma jovem menina aqui de Niterói, 13 anos, perdeu as duas pernas e está cega de uma vista no pós-Covid. Estamos aqui com um senhor com amputação de membro inferior pós-Covid. Fisioterapia respiratória..., gente, a coisa está muito séria e vai se estender", alertou.

O presidente do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade), Marco Carneiro, reclamou da falta de interlocução com o alto escalão do governo federal. A secretária nacional dos direitos da pessoa com deficiência, Priscilla de Oliveira, admitiu a defasagem e informou que o tema está em discussão no Comitê Interministerial de Tecnologia Assistiva (Cita).

Meta
O coordenador-geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, Ângelo Gonçalves, falou em meta de 10 milhões de procedimentos de órteses e próteses até 2023 a partir da expansão da rede de atendimento e da adoção de novas tecnologias. No ano passado, foram cerca de 6 milhões de procedimentos. Gonçalves informou que o ministério estuda reforçar a reabilitação de pacientes com sequelas de Covid-19 por meio do Fundo de Ações Estratégicas e Compensações (Faec).

"Esse projeto está linkado com um projeto de qualidade dos nossos serviços, para que aqueles que são credenciados e habilitados na reabilitação pós-Covid possam receber pelo Faec", disse.

Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
Audiência Pública - Debate sobre a Tabela de Custos dos Procedimentos, Medicamentos e OPM. Dep. Eduardo Barbosa(PSDB - MG)
Eduardo Barbosa sugeriu a criação de um grupo de trabalho para cobrar soluções do governo federal

Burocracia
Durante a audiência pública, deputados se queixaram de dificuldades burocráticas para usar os recursos orçamentários das emendas parlamentares no auxílio às instituições que atendem as pessoas com deficiência. Partiu do deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG) a ideia de um grupo de trabalho para cobrar do governo federal a "solução efetiva e urgente" para todas essas defasagens.

A presidente da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência, deputada Rejane Dias (PT-PI), ressaltou que a atual demanda não será pressionada apenas pelas sequelas físicas da Covid-19.

"Tem um outro problema que é a sequela que também envolve a saúde mental. Então, tem que se sentar para discutir isso e priorizar o orçamento. Isso parte, portanto, do governo federal", afirmou.

A ideia é que o grupo de trabalho tenha integrantes da comissão e da frente parlamentar que defendem os direitos das pessoas com deficiência. A frente marcou nova reunião para o fim deste mês a fim de aprofundar a ideia e analisar as respostas a questionamentos já encaminhados ao governo.

Reportagem - José Carlos Oliveira
Edição - Ana Chalub