29 de março de 2024
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Bolha estourou: clubes entram em 2015 sem dinheiro para contratações

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Após quatro anos de farra de gastos com o futebol, os clubes brasileiros sofrem uma asfixia financeira para 2015 com fuga de patrocinadores e investidores. Ao mesmo tempo, têm de renegociar suas dívidas fiscais e passar a pagá-las de verdade. Neste cenário, cartolas admitem que o ano será de recessão e vão tirar o pé nas negociações de salários de contratações. Essa é a primeira de uma série de três matérias sobre a crise no setor.

De 2010 a 2013, os gastos dos 24 clubes da elite do Brasil com futebol saltaram de R$ 1,3 bilhão para R$ 2,3 bilhões, segundo estudo do consultor Amir Somoggi. As receitas cresceram com a mesma força no início do período, mas se estagnaram nos últimos dois anos e ficaram em R$ 3,1 bilhões (lembre-se os times têm outros custos).

Esse cenário se acentuou com a redução das receitas em 2014 por conta da concorrência da Copa. Resultado: os clubes gastavam o que não tinham e acumularam déficit durante o ano.

Agora, são duas as principais causas para a crise a falta de patrocínios e a nova regra da Fifa que proíbe parceiros nos direitos de jogadores. Para 2015, os únicos dois patrocinadores que sobraram são a Caixa Econômica e o Banrisul (Inter e Grêmio): Cruzeiro, Atlético-MG perderam o BMG, a Unimed encerrou sua longa parceria com Fluminense. A maioria dos times tem sua camisa sem nada.

“O BMG saiu. A Caixa sabemos que não é marketing, tem outros motivos, e pode sair. Teremos camisas limpas neste ano. Vivemos um pico de preços de patrocínios em 2008 e 2009. Depois, os preços têm caído. Mas mesmo com preço baixo, tem que ser muito criativo para conseguir'', afirmou o diretor de marketing do São Paulo, Ruy Barbosa, que afirma ter esperança de obter um parceiro para o uniforme de seu time.

Outro impacto foi a regra da Fifa para proibir os investidores em direitos de jogadores. O mercado reagiu e quem botava dinheiro diminuiu ou fechou o bolso de vez.

“Será um ano muito ruim, muito difícil. O cenário brasileiro não é bom, e os investidores já tiraram o pé. Já estamos tendo o impacto. O futebol brasileiro estava fora da realidade. Não dava para trazer jogador da Europa e pagar mais do que eles ganhavam lá'', observou o diretor de futebol do Atlético-MG, Eduardo Maluf. Campeão da Copa do Brasil, o time pretende manter o patamar da folha salarial, sem aumentos, mas corre o risco de perder Diego Tardelli.

Outra questão foi o fato de o governo federal ter intensificado a fiscalização sobre os clubes de futebol, o que resultou em ações e execuções fiscais por dívidas como a ocorrida no Corinthians. O clube teve de entrar no Refis (programa de refinanciamento fiscal) e paga R$ 5 milhões por mês até o final do ano, valor que vai cair para R$ 500 mil em 2015.

“Será um ano em compassado de espera. Terá de fazer ajustes. Os clubes têm folhas razoáveis e não dá para reduzir contratos então será aos poucos. Haverá uma maior atenção na gestão'', analisou o diretor financeiro do Corinthians, Raul Corrêa e Silva.

Seu clube fez proposta milionária de US$ 5 milhões para manter Paolo Guerrero em descompasso com o restante do mercado. É a diretoria de futebol que toca essa negociação. O clube tem outros jogadores que não têm atuado e recebem como Pato e Sheik.

A estratégia de conter despesas dentro do que há disponível nas receitas, além de quitar dívidas e impostos, foi a adotada pelo Flamengo nos últimos dois anos.

“Estávamos na contramão, como mostrou um estudo, porque estávamos muito endividados. Mas a tendência é que outros clubes adotem essa política de responsabilidade. O Botafogo já mudou o discurso'', afirmou o presidente rubro-negro, Eduardo Bandeira de Mello. “Tenho ouvido os meus colegas muito preocupados.''

Ele enxerga um ano de transição para o seu clube, ainda apertado, mas melhor do que os outros dois anos anteriores, uma análise oposta aos outros times. Tanto que fez algumas propostas de compra de jogadores até € 4 milhões Isso porque não vê seu patrocínio ameaçado e haverá uma redução do valor pago no Refis.

Mas já está claro que ninguém vai sonhar com um “Pato'' ou outros delírios dos anos anteriores. Quem contratar será parcelado e talvez com a ajuda de um investidor que ainda confie no mercado.

Karla Machado com UOL