INTERIOR | TERENOS

Trator público é 'emprestado' à empreiteira que cobrou R$ 6,8 milhões por asfalto

Assentados estão desassistidos do maquinário, filmado no canteiro de obras da empreiteira

O presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR), Dorgival Rodrigues da Silva, estaria “emprestando” um trator entregue há 6 anos pela então deputada Tereza Cristina, aos produtores rurais do assentamento 7 de Setembro, em Terenos (MS).

O maquinário está sendo, de acordo com os assentados, usado pela empreiteira R.R. Construção Civil - que venceu a licitação de 2021 por R$ 4,799 milhões e pediu um aditivo de R$ 2.021 milhões em agosto desse ano, para a pavimentação de 5 quilômetros, do entroncamento da BR-262 até o Distrito do Cachoeirão. Isso é, a obra está saindo por mais de R$ 6,820 milhões, e ainda assim, a empresa estaria usando tratores públicos supostamente emprestados.   

Trata-se de um Trator Agrícola LS Plus 90 Rops que custo mais de R$ 920 mil aos cofres públicos. O maquinário foi entregue pelo governo federal para uso dos assentados por meio do “Programa de Fomento ao Setor Agropecuário”. Em conjunto, no ano de 2016, foi entregue também uma Grade Aradora Piccin Modelo GACR 14x28x600 e um Distribuidor de calcário e adubo Piccin Modelo Master 7500. Esse último não foi emprestado para a R.R, mas a grade e trator foram filmados no canteiro de obras. Veja abaixo: 

Diante do ‘desaparecimento’ do equipamento agrícola que deveria estar sendo oferecido aos produtores, em um grupo de WhatsApp, moradores fizeram diversas cobranças de explicações ao presidnete da Associação de Mulheres e Produtores Rurais do Assentamento 7 de Setembro (Amprosete), Haroldo Barcelos Martins. Esse respondeu que o equipamento estaria sob a tutela de Dorgival e que, então, as pessoas poderiam perguntar a ele diretamente. Ouça: 

Dorgival estava no mesmo grupo e se manifestou justificando: "Nego não paga quarenta conta de água, vai pagar R$ 34 mil num trator, se não é o bolso do Dorgival e a conta bancária dele, esse tinha ido, né? Queria ver quem é quem vai juntar para fazer espetinho aí, ia juntar R$ 34 mil para pagar manutenção do trator. Mas é isso, a gente fica dando explicação por que não quer? Porque a explicação quem dá é a gente, e as pessoas não entendem ou não querem entender... que o presidente do CMDF sou eu, Dorgival. Quem assina isso junto com o prefeito sou eu, Dorgival. E qualquer maquinário que tenha no município sou que autorizo junto com o prefeito. E quando as pessoas querem alguma coisa, eles acham meu número, acham minha casa, para buscar benefício. Eu nunca neguei nada para ninguém e também não escondo nada de ninguém, nem fiquei botando nem pedindo para ninguém ajudar, porque quando se tem responsabilidade a gente cumpre com ela, sabe?”, justificou. Ouça abaixo:

Dorgival também disse que ajuda pessoas a pagarem suas contas de água e que é um cidadão correto: “Eu não uso um litro de gasolina nem da associação e nem da prefeitura em meu favor, mesmo que seja para atender os outros. Eu faço isso com prazer!”, garantiu. 

Em outro áudio, questionado sobre a quem pertence o trator, Dorgival disse que o trator está à disposição do assentamento. “O Jair, ela está à disposição do assentamento sim, sabe? Foi eu que assinei o documento, porque na época que a Eucília foi passar, então, não tinha, as associações não quiseram assumir, para que ela não fosse retirada do assentamento eu assinei o compromisso a responsabilidade para permanecer aí. É por isso, vamos dizer assim, ele tem custo, tem gasto, tem despesa, você já teve trator, você sabe... mas ela está sim a disposição, não foi oficializado o documento ainda oficial, porque esse requer um tempo... e esse ano não, mas ano que vem  com certeza vai ser doada definitivo, né? Ela está cedida, né? Tem a cedência esse maquinário, mas vai vir mais maquinário esse ano para ser entregue, acredito que começo do ano mais um pouco, aí já vem a cedência definitiva. É igual as terras (sic)”, detalhou. Ouça abaixo:

A reportagem procurou Dorgival para questioná-lo sobre a veracidade dos fatos narrados pelos assentados e saber se procede a informação de que ele estaria alugando o equipamento à empreiteira. Entretanto, Dorgival  disse que “não iria falar nada por telefone”. Veja a mensagem abaixo:

Haroldo, da Amprosete, não respondeu as mensagens da reportagem e as os telefonemas feitos è ele não foram atendidas.

A prefeitura de Terenos, administrada por Henrique Wancura Budke (PSDB), por meio do Diretor do Departamento de Desenvolvimento Econômico, Agrário, Turismo e Meio Ambiente, Valdecir Batista Alves, disse que a responsabilidade do maquinário não seria da administração municipal: “O trator é do Estado desde 2017. Este CMDR é um Conselho que verifica se o maquinário está sendo bem utilizado, cuida de zelar dos maquinários daqui do município, mas neste caso aí, a responsabilidade é da Agraer ou da Semagro”, apontou. 

Por telefone, a Agraer disse que o maquinário não estaria sob a responsabilidade da entidade.

A reportagem, então, procurou a Semagro, por meio do Superintendente de Ciência e Tecnologia, Produção e Agricultura Familiar, Rogério Thomitão Beretta. Ele também negou que o equipamento esteja sob a responsabilidade da Semagro: “Quem te disse isso está mal-informado. Esse equipamento, acho que desde 2016, foi cedido para a prefeitura de Terenos”, garantiu. 

O MS Notícias confirmou, porém, que oficialmente o equipamento está cedido desde 14 de abril de 2018 à prefeitura de Terenos, conforme publicação em diário oficial. Veja: 

A reportagem tentou falar novamente com o município de Terenos, mas as ligações não foram atendidas. O espaço fica aberto para futuros esclarecimentos.  

Os telefones disponibilizados pela R.R. Construção Civil não atenderam nossas tentativas de ligação. Iríamos perguntar se a empresa está alugando ou de fato o bem público foi emprestado à ela.  

PRAZO DA OBRA

Já passa de um ano que a Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos de Mato Grosso do Sul (Agesul) lançou a licitação da obra de pavimentação asfáltica até o Distrito do Cachoeirão. 

A obra foi financiada com recursos do Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário de Mato Grosso do Sul (Fundersul) e a expectativa era que ficasse pronta em 180 dias, contados a partir de novembro de 2021, quando começaram os serviços. Entretanto, em 19 de maio de 2022 a empreiteira pediu aditivo de prorrogação, estendendo por mais dias, contado de 22/05/2022 a 18/10/2022.