'PIRÂMINDE FINANCEIRA'
Cauã Raymond, Tatá Werneck e Marcelo Tass são ligados a Pirâmide de R$ 7 bilhões alvo de CPI
Trabalharam para a Atlas Quantum, uma das empresas investigadas
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras aprovou na 4ª feira (23.ago.23), a quebra de sigilo bancário dos atores Cauã Raymond, Tatá Werneck e do apresentador Marcelo Tas. Eles fizeram propaganda para empresa Atlas Quantum, uma empresa do mercado criptomoedas, que aplicou golpes na ordem de R$ 7 bilhões.
De acordo com processos, a empresa causou prejuízo para cerca de 200 mil pessoas no Brasil e em outras 50 países.
A CPI também definiu a quebra de sigilo bancário do dono da empresa, Rodrigo Marques dos Santos.
"Requer que esta CPI decrete a quebra do sigilo bancário da empresa Atlas Quantum, pertencente à Rodrigo Marques dos Santos, CNPJ Nº 31.049.719/0001-40, e dos contratados, os senhores Cauã Reymond Marques e Marcelo Tristão Athayde de Souza, e a senhora Talita Werneck Arguelhes, assim como o acesso aos contratos e aos dados do pagador relativos às campanhas realizadas", diz o pedido do deputado bolsonarista Paulo Bilynskyj (PL-SP).
Perguntada sobre a decisão publicada no site oficial da Câmara dos Deputados, advogados de Tatá afirmaram que a atriz foi somente uma prestadora de serviços sem qualquer envolvimento com as atividades e rotina da Atlas. Os advogados Ricardo Brajterman e Maíra Fernandes, que fazem a defesa de Tatá Werneck, se manifestaram: "Causou grande perplexidade essa convocação, porque Tatá atuou somente como garota propaganda da Atlas, há longínquos cinco anos, ocasião em que não havia nada que desabonasse aquela empresa".
"Ora, se o Banco Central, a CVM, o Ministério Público, a Receita Federal e os demais Órgãos Reguladores permitiam a atividade da Atlas junto ao grande público, como poderia a Tatá, que é somente uma atriz, adivinhar que essa empresa teria alguma atividade ilegal? É óbvio que se Tatá soubesse que a Atlas viria a se envolver em algum escândalo, lesando seus consumidores, ela jamais aceitaria vincular sua imagem àquela empresa, cabendo destacar que Tatá nunca investiu na Atlas; nunca foi sócia da Atlas ou teve qualquer participação nos rendimentos da Atlas. Tata foi somente uma prestadora de serviços sem qualquer envolvimento com as atividades e rotina da Atlas", diz a nota.
Cauã foi questionado sobre o assunto durante a cerimônia do Grande Prêmio de Cinema Brasileiro e disse que não falaria sobre isso. Marcelo Tas, que inclusive foi um dos que caiu no golpe da empresa, não se manifestou.
'ROBÔ MILAGROSO'
A Atlas Quantum foi fundada em maio de 2018 por Rodrigo Marques dos Santos e Fabrício Spiazzi Sanfelice Cutis, em São Paulo. Na época, eles diziam ter um suposto robô de arbitragem, chamado “Quantum”, capaz de realizar compra e venda automática de Bitcoin (BTC) entre diferentes exchanges, sempre com lucro. Era mentira.
Em 2019, o negócio chamou atenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que determinou que a empresa parasse de ofertar seu “robô milagroso”, entendido pela agência como um contrato de investimento coletivo (CIC). Se não parasse, uma multa de R$ 100 mil por dia seria aplicada.
A partir daquele mês, a Atlas Quantum parou de pagar os resgates dos investidores. O negócio passou então a ser alvo de centenas de processos judiciais em todo o Brasil. Só em São Paulo, segundo dados do Projudi, são 730 ações civis. Algumas pessoas conseguiram reaver parte do dinheiro, mas a maioria ainda espera uma ação da Justiça — os processos estão em curso.
Em agosto de 2021, a Atlas Quantum resolveu processar a CVM em R$ 3 bilhões, acusando o órgão regulador de danos morais e materiais por ter suspendido seu produto. A ação, no entanto, não prosperou e a Atlas não se manifesta apenas nos autos do processo desde março do ano passado. O regulador não comenta ações judiciais em andamento.
A partir da denúncia de um investidor, um inquérito criminal também foi aberto na Justiça de São Paulo. Devido à existência de possíveis crimes contra o sistema financeiro nacional, o caso foi remetido para o Ministério Público Federal (MPF), e a Polícia Federal (PF) entrou na jogada.
Em um revés jurídico, no entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) devolveu o caso para a esfera estadual, interrompendo as investigações da PF.
“Infelizmente, as apurações não têm evoluído adequadamente na Justiça, aparentemente por falta de entendimento e/ou interesse das autoridades”, disse o advogado Artêmio Picanço, especialista em casos envolvendo o uso de criptomoedas e blockchain.
“É preciso que se tenha maior força do poder público, especialmente do poder de investigação, para que esse caso não fique adormecido e esquecido no Brasil como um grande caso que não teve sequer uma finalização do inquérito policial, tampouco um pedido de prisão emanado para o senhor Rodrigo Marques, gerando uma sensação de impunidade”, falou.
Fortuna em criptomoedas
Após o caso, o fundador e CEO da Atlas Quantum sumiu do Brasil. De acordo com advogados e pessoas envolvidas com o caso, ele morou no México e na Espanha, esbanjando uma vida luxuosa com o dinheiro desviado dos investidores.
Na país europeu, segundo as pessoas ouvidas pelo InfoMoney, o antigo magnata do setor cripto nacional morou em mansão de cerca de 1,2 milhão de euros — um indicativo, dizem as pessoas, de que o dinheiro ainda existe.
Ex-funcionários da área de tecnologia da Atlas, que tinham acesso aos dados, afirmaram que, no início de 2020, a Atlas tinha 16673.59976081 unidades de BTC e 21426804.33764274 de Tether (USDT) sob custódia, o que equivale a cerca de R$ 2,5 bilhões.
Em agosto de 2019, segundo relatório acessado pela reportagem, a gigante de auditoria Grant Thornton também atestou que a empresa tinha 15226,1 BTC e 34.793.966,2 USDT, o que equivale hoje a aproximadamente R$ 2 bilhões.
A defesa da Atlas foi contatada e questionada sobre o andamento do processos e do caso, mas não quis comentar.
CPI
A Atlas Quantum é apenas uma das empresas investigadas na CPI das pirâmides financeiras, aprovada em maio na Câmara dos Deputados. Outros casos que geraram perdas para os investidores, como Genbit (antiga Zero10 Club), Trader Group, Braiscompany e até o fracassado fan token lançado pela Seleção Brasileira também entraram na mira dos deputados.
“Queremos acabar com essa lógica que tentaram dar de que o investimento pode ter garantia [de retorno mensal] de 10% ou 15%. A falta de conhecimento fez vários brasileiros entrarem em crimes como esses”, disse o deputado Áureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), autor da proposta da CPI, para o InfoMoney.
Participantes do mercado cripto, em especial profissionais de direito atuantes na área, receberam bem a notícia da investigação do poder legislativo.
“Entendo ser válido todo olhar mais atento e o uso das forças do Estado para coibir práticas ilícitas. Nesse sentido, sem dúvida, a CPI — quando bem utilizada — é uma ferramenta constitucional poderosa”, disse Nicole Dyskant, advogada especialista em regulação e compliance para ativos digitais.
De acordo com ela, casos de golpes financeiros que usam criptoativos como isca vêm manchando o mercado de ativos digitais, que nada tem a ver com fraudes.
“Essa confusão prejudica a imagem dos criptoativos que tanto podem revolucionar o mercado financeiro e proporcionar mais acesso para aqueles que hoje são excluídos do sistema financeiro tradicional”.
FONTE: INFOMONEY
