A queda-de-braço entre Jair Bolsonaro e Luiz Henrique Mandetta ganhou capítulos novos e mais incendiários neste final de semana. Na noite de ontem (quinta-feira.2.abril) o presidente criticou o ministro com ironia e mordacidade, além de insinuar que já está cogitando exonerá-lo.
"Não pretendo demiti-lo no meio da guerra, mas em algum momento ele extrapolou. Sempre respeitei todos os ministros. A gente espera que ele dê conta do recado. Não é uma ameaça para o Mandetta. Nenhum ministro meu é indemissível, como os cinco que já foram embora", alfinetou Bolsonaro em entrevista à Rádio Jovem Pan (SP), emissora que é declaradamente favorável a ele e a seu governo.
Ao admitir que ele e o ministro andam se bicando, Bolsonaro disse que Mandetta não é humilde e não ouve o presidente tanto quanto deveria. "Acho que o Mandetta teria que ouvir mais o presidente. Ele disse que tem responsabilidade, mas ele cuida da saúde, o (Paulo) Guedes da economia e eu entro no meio. O Mandetta quer fazer valer muito a própria vontade. Pode ser que eles esteja certo, mas está faltando humildade para ele conduzir o Brasil neste momento", disparou.
IGNORÂNCIA
O presidente insiste em ignorar as orientações da Medicina e os protocolos da Ciência que recomendam o máximo de isolamento social das pessoas como principal postura de prevenção ao contágio e inibidora da rápida propagação do Covid-19. É este o motivo central da pendenga, apesar de outro ingrediente, de natureza política, estar presente na receita desse bolo. Mandetta contraria Bolsonaro. Repete sempre que seguirá a Ciência. E o presidente, que já disse estar “de saco cheio” com o ministro, o acusa de agir só por conta própria:
“Aquela histeria, aquele clima de pânico contagiou alguns lá [dentro do Ministério da Saúde]. Já está no momento de todo mundo botar o pé no chão", irrita-se Bolsonaro. E, provocativo, conta que estuda editar uma medida provisória para esvaziar o isolamento social e devolver o grosso da população à rotina. A iniciativa iria ao encontro do que o presidente sempre defendeu, de que o isolamento deve ser limitado a idosos e pessoas com doenças graves. Segundo ele, o retorno ao comércio poderia ser determinado a partir de uma canetada.
“Tem Medida Provisória pronta para assinar que torna indispensável toda atividade para trabalhador levar o pão para casa. Se for necessário, vou assinar a MP, mas tem ameaças para cima de mim, inclusive do meu afastamento”, disse Bolsonaro na entrevista, antes de prever que o comércio, com isso, ficaria aberto até STF ou Congresso derrubarem o decreto.
“EU TRABALHO”
Mandetta desviou-se olimpicamente de um confronto verbal, porém respondeu com uma frase sintomática: “Não comento o que o presidente da República fala. Ele tem mandato popular, e quem tem mandato popular fala. Quem não tem, como eu, trabalha". Com sua atuação no combate ao coronavírus elogiada até por adversários e autoridades mundiais, o ministro é considerado um dos mais populares da Republica, ombreando com o titular da Justiça e Segurança Publica, Sérgio Moro.
Mandetta sabe que está sendo forçado a sair, mas não entrega os pontos e já disse ao próprio Bolsonaro que, se quiser, que o demita. "Acho que estamos frente a uma doença nova, e está todo mundo aprendendo com essa doença. Vamos saber o que ela vai fazer com nosso sistema de saúde. Rezo a Deus que nada disso aconteça aqui, que eu esteja absolutamente errado, que toda a ciência esteja absolutamente errada", enfatiza.
Além da divergência entre isolamento social drástico e o isolamento vertical (só para os idosos e grupos de risco), Mandetta caiu no desagrado presidencial porque não atendeu a “guerra fria” que Bolsonaro decretou contra os governadores Dória Jr, de São Paulo, e Wilson Witzel, do Rio de Janeiro. Mandetta mantém relações amistosas com Dória e o atende quando solicitado.
Numa de suas recentes viagens a São Paulo, chamado para uma atividade relacionada ao combate à pandemia, Mandetta deixou Bolsonaro profundamente irritado. Explica-se: Dória é considerado inimigo por Bolsonaro porque pode ser seu mais sério concorrente na disputa pela presidência em 2022.