A política brasileira segue firme em sua capacidade de produzir constrangimento público. Desta vez, o gatilho da crise existencial da extrema direita foi um comercial de chinelos. Sim, chinelos. A campanha da Havaianas estrelada por Fernanda Torres — atriz premiada internacionalmente — foi suficiente para provocar um surto coletivo no conservadorismo, que decidiu tratar publicidade como conspiração ideológica.
A frase da campanha, que convida o público a entrar em 2026 “com os dois pés para onde quiser”, não menciona governo, partido ou ideologia. Ainda assim, a extrema direita, no auge do seu delírio e falta de pautas, enxergou ali um chamado revolucionário. O resultado foi previsível: vídeos performáticos, boicotes de internet e políticos disputando quem cancela mais rápido uma marca que atravessa gerações — e classes sociais.
Em Mato Grosso do Sul, o deputado federal Rodolfo Nogueira (PL), conhecido como "Gordinho do Bolsonaro" — sim, ele adota esse apelido ridículo — resolveu dramatizar o momento histórico jogando pares de Havaianas no lixo. Mesmo confessando que sempre usou a marca, decretou que “aqui em casa não entra mais”. A cena resume o bolsonarismo raiz: consumo militante, indignação seletiva e zero senso de proporção ou falta do que fazer. Atuam como verdadeiros sanguessugas do dinheiro público.
Marcos Pollon (PL-MS) correu para sugerir uma marca alternativa, como se estivesse liderando uma cruzada industrial contra o “globalismo do chinelo”. Rafael Tavares (PL) apelou ao mantra gasto do “de quem lacra não lucra”, ignorando o detalhe inconveniente de que a Havaianas continua lucrando — e muito — enquanto o cancelamento vive restrito às timelines.
À esquerda, a reação foi de escárnio calculado. A deputada federal Camila Jara (PT) ironizou a “nova pauta da extrema-direita”, expondo a contradição de um campo político que se diz liberal, mas entra em pânico quando uma marca não se comporta como cartilha ideológica. Vereadores petistas reforçaram o óbvio: Havaianas é produto popular, enraizado no cotidiano do povo brasileiro — não um panfleto partidário.
KEMP ACERTOU ONDE DÓI
O deputado estadual Pedro Kemp (PT) foi direto ao ponto e sintetizou o episódio com um meme que viralizou: enquanto a esquerda usa Havaianas, a direita usa tornozeleira eletrônica. A frase não apenas provocou — diagnosticou. O incômodo foi imediato porque tocou na ferida de um campo político que tenta substituir projeto de país por guerra cultural permanente.
Gleice Jane anunciou que entrará em 2026 “com os dois pés na esquerda”. Fábio Trad apareceu fazendo o “L” com um par de Havaianas nas mãos. Já a direita seguiu debatendo chinelos, como se o país não tivesse problemas reais a enfrentar.
No balanço final, a cena é cristalina: uma atriz premiada, uma marca consolidada e um setor político inteiro paralisado por um slogan publicitário. A direita não caiu por causa da Havaianas. Apenas escorregou — de novo — na própria falta de agenda.











