20 de abril de 2024
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Atuação no golpe, nomeações e delações comprometem Rocha na Comissão de Ética

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Escolhido para presidir a Comissão de Ética da Câmara Municipal, que tem a atribuição de apurar a responsabilidade de integrantes do Poder Legislativo no processo de cassação do prefeito Alcides Bernal – irregular, de acordo com a Justiça -, o vereador João Rocha (PSDB) vem a ser um dos principais alvos de questionamentos e suspeitas.

Os indícios da participação dos vereadores no golpe são abundantes e foram documentados pela Polícia Federal, Ministério Publico e Gaeco (Grupo de Apoio especial de Combate ao Crime Organizado). Comprovada a participação de parlamentares no golpe, a Comissão de Ética teria, em tese, a obrigação de enquadrar os envolvidos por quebra de decoro parlamentar e propor cassação de seus mandatos. Porém, aflora uma hipótese que contraria essa previsão: o presidente da Comissão, com o poder inerente à função e o apoio de colegas do colegiado, poderia buscar uma solução corporativa e menos drástica para tirar os mandatos da corda bamba.

Os laços que uniram Rocha ao vice-prefeito Gilmar Olarte (PP) e ao esquema que derrubou Bernal são explícitos e bastante firmes. Além de ser escolhido por Olarte para ser seu líder na Câmara, o tucano teve as portas da Prefeitura abertas para encaixar seus apadrinhados. Ele era, por exemplo, dono absoluto das indicações para a presidência da Fundação Municipal de Esporte (Funesp). Foi Rocha quem indicou José Eduardo da Mota, o madrugada, o primeiro titular da Fundação no governo Olarte.

Dias antes de a Justiça conceder a liminar que tirou Olarte do poder e devolveu a Bernal o cargo de prefeito, Madrugada aceitou convite da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) para dirigir equipes de base e deixou a Funesp. João Rocha já tinha um nome para substitui-lo – era Leocy Marinho de Sá, um de seus mais importantes colaboradores e amigo de longa data. Leocy tomou posse no dia cinco de agosto passado.

Professor de Educação Física formado na Universidade Federal (UFMS), o novo presidente não completou um mês no cargo. Na manhã de 25 de agosto, 20 dias após Leocy assumir a Funesp, a Operação Coffe Break, do Gaeco, fez um arrastão na cidade, detendo políticos e empresários, entre os quais vários vereadores, e apreendendo documentos e celulares no curso de investigações sobre o golpe que cassou o mandato de Bernal. E à tarde a Justiça completou o enredo de deposições daquela véspera do aniversário de Campo Grande: por dois votos a um, desembargadores do Tribunal deram novamente o mandato de prefeito a Bernal e afastaram Olarte. O TJ-MS endossou uma liminar do juiz da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos, Individuais e Homogêneos, David de Oliveira Gomes Filho, para quem o decreto da Câmara cassando Bernal estava irregular, conforme ação popular impetrada pelos vereadores Ayrton Araújo e Zeca do PT, Paulo Pedra (PDT), Cazuza (PP) e Luiza Ribeiro (PPS).

DELAÇÕES – Para reforçar os questionamentos à independência de Rocha no comando da Comissão de Ética, o vereador Aírton Saraiva (DEM) pôs mais lenha na fogueira. Em depoimentos, como testemunha, ao Gaeco, ele revelou parte da trama concebida para derrubar Bernal e ungir Olarte. Saraiva, que é também advogado, contou ter participado de reuniões nas residências do colega Wanderlei Cabeludo (PMDB e do tucano João Rocha. E revelou mais, citando outros colegas partícipes dessas reuniões, entre os quais Gilmar da Cruz (PRB) e Waldeci Chocolate (PP).

A Comissão de Ética presidida por Rocha tem a tarefa inicial de investigar os vereadores peemedebistas Mário César (ex-presidente da Câmara, afastado do cargo pela Justiça), Edil Albuquerque (ex-líder de Olarte) e Paulo Siufi; Aírton Saraiva (DEM); Waldeci Chocolate (PP); Gilmar da Cruz (PRB); Edson Shimabukuro (PTB); Carlão Borges (PSB); e Jamal Salem (PR), ex-secretário de Saúde na gestão de Olarte. Além do presidente João Rocha, a Comissão de Ética é constituída pelos vereadores Herculano Borges (SD), Ayrton Araújo (PT), o vice-presidente Chiquinho Telles (PSD) e Wanderley Cabeludo.

As revelações de Saraiva, que colegas contrariados receberam como uma verdadeira delação, são suficientes para esvaziar a autoridade necessária a um colegiado com esse nível de responsabilidade. Afinal, são os próprios parlamentares, num colegiado com inclinações naturalmente corporativas, que se estarão investigando, analisando, julgando e decidindo a vida de seus mandatos e de seus passos políticos para o futuro.