28 de março de 2024
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Bolsonaro pode ter cometido crime de advocacia administrativa para trocas na PF

Análise dos procuradores é que, após ter acesso ao vídeo da reunião ministerial, ficou claro que Bolsonaro pressionou Moro por mudança em cargos na PF motivado por interesses pessoais

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A equipe de investigadores da Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia que as provas obtidas até o momento são suficientes para caracterizar que o presidente Jair Bolsonaro cometeu o crime de advocacia administrativa em sua pressão para trocar postos-chave da Polícia Federal.

A análise dos procuradores é que, após ter acesso ao vídeo da reunião do conselho de ministros no último dia 22 de abril, ficou claro que Bolsonaro pressionou o então ministro da Justiça, Sergio Moro, para fazer mudanças em cargos na PF motivado por interesses pessoais — no caso, a preocupação em proteger familiares e amigos, verbalizada pelo próprio presidente na referida reunião. O vídeo inclusive, na avaliação dos investigadores, traz uma comprovação rara de se obter nesse tipo de crime que é o “dolo”, a vontade de cometer o delito.

No registro audiovisual, Bolsonaro cita seu desejo de trocar o superintendente da PF do Rio em troca da proteção de familiares e amigos. Ele usa a expressão “segurança nossa no Rio”, mas a avaliação dos investigadores é que o termo se refere à Superintendência da PF. O vídeo foi divulgado na sexta-feira por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, relator do inquérito.

— Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. E isso acabou. Eu não vou esperar foder minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar; se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final — disse no vídeo.

O QUE DIZ A LEI

Outra prova que corroboraria o crime é a mensagem enviada por Bolsonaro a Moro, citando como “mais um motivo para a troca” da direção-geral da PF uma notícia que mostrava que o inquérito das fake news está investigando deputados bolsonaristas. Também reforçou a suspeita o fato de ter tramitado na PF do Rio um inquérito eleitoral contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) sobre ocultação de bens e evolução patrimonial, o que é visto como uma prova de interesse direto do presidente no controle da Superintendência do Rio.

Por último, a sucessão de fatos posteriores à reunião é vista como mais uma prova: dois dias após o vídeo ocorreu a demissão de Valeixo e a saída de Sergio Moro. Pouco depois, veio a nomeação de um novo diretor-geral da PF que teve como um dos seus primeiros atos trocar o superintendente do Rio.

Essa análise será transmitida ao procurador-geral da República, Augusto Aras, ao final do inquérito em tramitação perante o Supremo Tribunal Federal (STF), para que ele decida se há elementos para apresentar uma denúncia contra Bolsonaro ou se é o caso de arquivamento. Aras tem dito que só vai fazer uma avaliação jurídica do caso depois que a investigação se encerrar e ele puder analisar todas as provas produzidas.

O crime de advocacia administrativa está previsto no artigo 321 do Código Penal e é descrito da seguinte forma: “ Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário”. Quando esse ato é feito em busca de um “interesse ilegítimo”, a pena prevista em lei é de detenção de três meses a um ano, além de multa.

Na avaliação dos procuradores do caso, já está devidamente caracterizado que houve tentativa de pressionar e influenciar um agente público, no caso Sergio Moro, para patrocinar os interesses privados de Bolsonaro, que seria a proteção de seus familiares e amigos.

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