26 de abril de 2024
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Com perfis falsos na internet, esfaqueador de Bolsonaro fez menção ao PCC

Adélio Bispo prometeu 'revolução' com facção caso Bolsonaro ganhe

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A cúpula da Polícia Federal se assustou quando apareceram as primeiras menções ao Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que controla o tráfico de drogas e armas na fronteira de Mato Grosso do Sul com Paraguai e Bolívia, no segundo inquérito que investiga Adélio Bispo de Oliveira, 40 anos, detido no Presídio Federal de Campo Grande por esfaquear o candidato à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro, em Juiz de Fora (MG), no dia 6 de setembro. Mas o alarme, aparentemente, é falso.

Utilizando perfis falsos em redes sociais na internet, Bispo foi além de prometer "uma revolução" no Brasil comandada pela facção criminosa caso Bolsonaro seja eleito. Também enviou mensagens para lideres petistas dando conselhos de como Fernando Haddad, atualmente no segundo turno da disputa contra o candidato do PSL, pode vencer o pleito.

As revelações vieram à tona nesta segunda-feira (15). Primeiro por meio da coluna do jornalista Ancelmo Gois. Depois pelo 'Estado de Minas'. De acordo com o apurado pelo Correio do Estado, Bispo tinha uma rede com mais de 12 perfis falsos onde tentava se comunicar com lideranças petistas e debatia publicamente com eleitores de Bolsonaro.

Na primeira leva de mensagens, a PF descobriu que a ex-senadora Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, era um dos alvos preferidos de Bispo. Por pelo menos 19 vezes antes do fatídico 6 de setembro ele criticou a conduta do partido na campanha de Haddad, sugeriu que o tom fosse mais radical e que se encerrasem alianças. "Vocês viram onde os acordos levaram Dilma (Rousseff, ex-presidente que sofreu impeachment em 2016)", disse em uma das mensagens.

Mas é nessa segunda leva de mensagens que Bispo chamou a atenção dos chefes da PF. E que cuja investigação será redobrada. Nela, também com uso de nomes falsos, o esfaqueador de Bolsonaro promete que convocará o PCC "para organizar uma revolução armada no Brasil."

INVESTIGAÇÕES

A PF instaurou um novo inquérito para dar continuidade à investigação sobre o ataque a faca de Adelio Bispo. O primeiro foi encerrado no início de outubro por causa do prazo mais curto devido ao fato do acusado estar preso. Na Justiça Federal, investigações com réu preso podem durar no máximo 30 dias.

Segundo a reportagem apurou, após ouvir mais de 30 pessoas, quebrar os sigilos financeiro, telefônico e telemático de Bispo, o delegado federal Rodrigo Morais e sua equipe não encontraram nenhum indício de que o autor da facada tenha agido a mando de outra pessoa ou em grupo.

O segundo inquérito vai herdar do primeiro todas as informações colhidas. Além das quebras de sigilo e depoimentos, a PF vai analisar todo o sistema de câmera da cidade de Juiz de Fora (MG), onde ocorreu o ataque, para traçar todos deslocamentos de Bispo desde sua chegada na cidade.

O objetivo da nova apuração, segundo relatou um investigador, é fazer uma devassa nos últimos dois anos da vida de Bispo e mapear qualquer relação dele com outras pessoas que possam indicar a participação de mais pessoas no ataque.

Embora vá se debruçar sobre todas as informações coletadas novamente nessa segunda investigação, a PF já descartou varias das hipóteses levantadas, principalmente, por apoiadores de Bolsonaro.

Todas pessoas indicadas por seguidores do candidato nas redes sociais como sendo “ajudantes” de Bispo foram investigadas e não foram encontradas indícios mínimos de participação na ação. Entre essas pessoas, como revelado, foram ouvidas três mulheres com o nome Aryanne Campos. 

Segundo os apoiadores de Bolsonaro, a mulher com esse nome teria passado a faca para Bispo. A versão foi completamente descartada investigação.

Na verdade eram perfis falsos usados pelo próprio acusado.

Adélio Bispo chega a Campo Grande após transferência (Gérson Oliveira/Correio do Estado)

REVELAÇÕES

Os investigadores descobriram que a escolha da faca como arma para o crime é explicada pelo fato de Bispo ter trabalhado como açougueiro e em uma restaurante de comida japonesa.

A PF também esmiuçou todas as transações financeiras de Bispo. Não foi encontrado nenhuma movimentação suspeita. O único depósito em espécie anormal teve origem em uma causa trabalhista. O cartão internacional que ele tinha nunca havia sido utilizado e foi enviado pelo banco sem a solicitação de Bispo.

Os equipamentos eletrônicos – celulares e notebook – também foram analisados. Dois dos quatro celulares estavam desativados e os outros não continham, pela apuração feita até agora, informações sobre contato com outras pessoas para a prática do crime. O notebook encontrado com ele estava quebrado e não era utilizado há cerca de um ano.

SEQUÊNCIA

Bispo será enquadrado pela PF no artigo 20 da Lei de Segurança Nacional.

Esse artigo prevê a punição para quem cometer “atentado pessoal” por “inconformismo político”. Segundo a investigação da PF, foram as divergências políticas entre Bispo e Bolsonaro que levaram o ex-açougueiro a atacar o candidato.

Somente após a conclusão do segundo inquérito é que a PF decidirá se indicia ou não Bispo por alguns dos crimes cibernéticos, visto que a tentativa de homicídio é considerado delito de maior importunação ofensiva.

Ao Correio do Estado, o advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, que comanda a junta responsável pela defesa de Bispo, afirmou se sentir aliviado pelas investigações até agora não mostrarem a participação de ninguém no ataque a Bolsonaro. "Nossa tese é verdadeira desde o início", disse.

Depois da conclusção do primeiro inquérito da PF e a autorização da Justiça para a elaboração do laudo por parte do psiquiatra paulistano Hewdy Lobo Ribeiro, a defesa quer confirmar a alegação de insanidade mental. Duas reuniões estão sendo realizadas por semana em Campo Grande entre os dois para entrevistas e exames, sem dias certos.

Parte da justificativa a ser usada além do laudo, contudo, já está pronta: familiares de Bispo e amigos dos tempos de escola gravaram depoimentos onde confirmam os problemas psicológicos do esfaqueador, incluindo o apelido de 'Tonho da Lua' pelo qual era chamado, referência ao personagem de Marcos Frota na novela 'Mulheres de Areia', cujo remake foi exibido em 1993 pela 'Rede Globo'.

Sobre as denúncias feitas em sites pró-Bolsonaro, de que Bispo seria levado de volta a Minas Gerais para ficar ao lado da família, Júnior desdenhou e garante que o acusado seguirá preso na Capital. "Não tem para onde ele ir. Está bem e seguro onde está agora", disse.