26 de julho de 2024
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'CORRUPÇÃO LAVA JATO'

CNJ afasta Gabriela Hardt por 'cashback judicial' de R$ 2,5 bilhões

Liderada por Deltan Dallagnol, a força-tarefa é suspeita de corrupção bilionária para a 'Fundação Lava Jato'

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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afastou nesta segunda-feira (15.abr.24) a ex-titular da 13ª Vara de Curitiba, Gabriela Hardt, sucessora de Sergio Moro no comando da Lava Jato, e o atual magistrado responsável pela 13ª Vara Federal de Curitiba, juiz Danilo Pereira Júnior. A decisão é do corregedor nacional de Justiça, Luís Felipe Salomão. Eis a íntegra.

"Os atos atribuídos à magistrada Gabriela Hardt, além de possivelmente configurarem tipos penais como peculato-desvio (artigo 312 do Código Penal), prevaricação (artigo 319 do Código Penal), corrupção privilegiada (art. 317, § 2º, do Código Penal) ou corrupção passiva (artigo 317, caput, do Código Penal), também se enquadram em infrações administrativas graves, constituindo fortes indícios de faltas disciplinares e violações aos deveres funcionais da magistrada", declarou Salomão na decisão.

"A natureza da atividade desempenhada pela reclamada exige atuação proba, íntegra e transparente. É inaceitável que, ao que parece, descambando para a ilegalidade, a magistrada se aproveite da relevante função que o Estado lhe confiou para impor suas convicções pessoais. Torna-se, portanto, inconcebível que a investigada continue atuando, quando paira sobre ela a suspeita de que sua atuação não seja lícita e imparcial como se espera. Nesse contexto, o afastamento visa resguardar a ordem pública, seriamente comprometida pelas condutas irregulares dos reclamados, e também atende à necessidade de coibir a aparente conduta infracional", acrescentou o corregedor.

Além deles, também foram afastados Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz e Loraci Flores de Lima, que atuam no TRF-4. O quinteto é acusado de burlar a ordem processual, violar o código da magistratura, prevaricar e até desobedecer decisões do Supremo.

Salomão revelou que Hardt cometeu violações do Código de Ética da Magistratura ao aprovar a criação da fundação privada da Lava Jato com informações incompletas e informais. Ele mencionou que o esquema se assemelhava a um "cashback" (forma de devolução de impostos ao contribuinte). "Constata-se, com grande decepção, que, em certo momento, a ideia de combate à corrupção foi transformada em uma espécie de 'cash back' para interesses privados, ao que tudo indica com o aval e participação dos agora reclamados", detalhou.

Liderados por Deltan Dallagnol, a força-tarefa da Lava Jato receberia R$ 2,5 bilhões que a Petrobras pagou em multas nos Estados Unidos.

Salomão apontou que no relatório, Moro e Hardt determinaram que a Petrobras era a 'vítima' por conta própria. E que Hardt sozinha comandou acordos sem transparência e sem trânsito em julgado, que somam R$ 5 bilhões. "Atuação da Juíza em processo autônomo (instaurado de ofício, com absoluto sigilo e sem a participação dos interessados) para suposto controle e destinação de valores oriundos de acordos de colaboração e leniência, inclusive referentes a ações penais sem sentença e, também, sem trânsito em julgado, estabelecendo critérios sem fundamentação legal, eivados de contradição e sem transparência, atingindo montantes superiores a 5 bilhões de reais".

Segundo Salomão, os juízes federais da Lava Jato podem ter feito acordos à revelia com o judiciário americano. "Destaca-se, ainda, a ausência de documentos que demonstrassem como o acordo internacional que originou o documento homologado teria sido desenvolvido e operado entre os procuradores da força-tarefa da 'Operação Lava Jato', a Petrobras e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América (DOJ)".

Segundo o relatório, suspeita-se que diversos membros do Ministério Público Federal criaram casos em conjunto com o governo americano com intuito de acessar os recursos "multas" a serem pagos. Os juízes também teriam atuado para que a empresa Petrobras não fosse investigada em inquéritos civis públicos no Brasil pelo prejuízo efetivo causado aos acionistas em razão de suas falhas nos mecanismos de governança e controle. Em troca, os acionistas trabalhariam num acordo com os juízes para que R$ 2.567.756.592,009 - referentes às multas - fossem enviados para uma fundação privada que seria criada em apoio à 'Lava Jato'.

A própria Hardt confessou em depoimento realizado em 17 de janeiro de 2023, na Seção Judiciária da Justiça Federal em Curitiba, que os comparsas a pressionaram para homologar um acordo de não persecução penal, o qual ela receberia o modelo no WhatsApp. Ela chegou a discutir o caso com Deltan Dallagnol. "Conversei com os colegas antigos, o Josegrei, os outros colegas do crime que eram mais antigos e expliquei o que o Ministério Público queria de mim, porque foi naqueles quatro meses caóticos {refere-se a depoente a um período em que atuou como única magistrada na 13ª Vara]... e o Ministério Público dizendo que se eu não decidisse a gente ia perder dois bilhões e meio e o Brasil ia deixar esses dois bilhões e meio nos Estados Unidos. Conversei com os colegas mais antigos: 'eu acho que é razoável', 'eu acho que é razoável', daí veio o pedido formalmente no processo [prossegue a depoente expondo seu processo decisório]. E eu lembro que conversei... com... doutor DELTAN lá... com os meninos da força-tarefa. Eu falei: olha! O que eu quero de vocês: publicidade ampla. Eu vou homologar, vocês divulguem isso o máximo possível

 [...]. Porque o que eu vou fazer é trazer esse dinheiro pro Brasil, (trecho inaudível)... que vocês estão falando, vou homologar. Eles até falaram, no projeto de fundação, que teria participação do Judiciário, eu falei não, não. O juiz não vai participar da fundação. É a sociedade civil, o Ministério Público, que nem uma fundação normal [...]. (Aproximadamente 00:58:00h). Troquei mensagem... poucas, eu acho que troquei. Eu acho que até esse esboço de fundação eu acho que veio por mensagem, tá? Nunca orientei... as mensagens que eu já vi da spoofing [refere-se a investigação que apurou o acesso indevido a mensagens de Telegram de pessoas com atuação na operação Lava Jato]... eu tenho acesso às mensagens, que já pediram minha suspeição na vara porque o DELTAN teria dito {tenta se recordar]... 'a juíza tá cobrando que não veio as denúncias' [...]. (Aproximadamente 01:01:40h). [Ministro pergunta:] trocava mensagem com eles? Já troquei, ministro. Já troquei. Mas, assim, foi muito eventual. Eu pedi para não fazerem isso. Mas já troquei, sim. [Ministro pergunta:] sobre processo? Não, assim, é... era esse da fundação Lava Jato, era um que me lembro... esse da fundação era um que eu me lembro. Acho que já veio mensagem 'ah, acho que a gente precisa conversar sobre isso', daí eu falava 'agenda um horário'. Esse tipo de coisa, sim. (Aproximadamente 1:02:15h)", depõe Hardt.

"Outros fatores que apontam o movimento de aderência da magistrada aos interesses de uma das partes são: a) a petição do MPF é escassa de informações: há apenas a petição e o documento a ser homologado. O pedido não foi instruído com documentos que embasariam as afirmações feitas pelo MPF na petição inicial, bem como demonstrariam a própria legitimidade do MPF para firmar o acordo. A petição menciona a existência do ajuste realizado nos Estados Unidos, mas não traz esse documento, firmado entre PETROBRAS e autoridades americanas); e b) apesar da aludida novidade do pedido, a magistrada foi célere na homologação", reforçou Salomão.

"Há, também, um fato recentemente descoberto que ratifica o conluio entre parte e magistrada. A força-tarefa da Lava Jato protocolizou, no dia 18 de janeiro de 2019 - isto é, poucos dias antes da protocolização do pedido de homologação - às 14:19:40h, uma petição à magistrada com o único objetivo de determinar 'o arquivamento do 'Memorando de Entendimentos Para Negociação de Futuro Tempo de Ajustamento de Conduta', firmado entre a força-tarefa e a PETROBRAS em 27 de setembro de 2018, 'com baixa dos autos' (evento 1 dos autos nº 5001933-56.2019.4.04.7000/PR). No dia 21 de janeiro, às 15:27:09h, a magistrada proferiu decisão e determinou o arquivamento dos autos, sem vinculá-lo ao pedido subsequente", observou o corregedor.

Sobre os outros 3 juízes afastados, Salomão alega que os magistrados desobedeceram "de forma deliberada" as ordens do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao decidirem pela suspeição do ex-juiz da Lava Jato Eduardo Appio. Eis a íntegra.