28 de abril de 2024
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EDUCAÇÃO FRAGMENTADA

Escola 'chique' é acusada de censurar e demitir professores que tocam em 'temas proibidos'

Escola particular da capital teria adotado posicionamento desde o início de 2021

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A unidade 3 da escola de ensino particular bilíngue Harmonia de Campo Grande é acusada de demitir professores de arte que falam em temas de liberdade de expressão, professores que abrem debate sobre racismo, identidade de gênero e até aqueles que se manifestam politicamente nas redes sociais. "Não pode se manifestar. Eles me disseram que se eu quisesse trabalhar lá teria que fechar minhas redes sociais ou nem me manifestar", diz educadora que terá o nome preservado.  

A sequência de demissões ficou evidente após um professor, durante uma aula de fotografia, citar um dos temas proibidos: racismo estrutural. "Ele foi demitido por isso, porque quis orientar os alunos. Os professores de arte lá não podem ensinar nada é só para enrolar, uma aula de recreação, sabe? Não podem falar de história, nada. As crianças ficam pintando caixa de fósforo, só enganação", disse outra educadora que atuou na escola. 

Uma das educadoras que foi demitida sem motivo específico, em meio a pandemia, disse acreditar que a demissão tenha relação com a sua orientação sexual. Ela diz que não informaram nenhum motivo da sua demissão e pediram que ela fosse embora no meio de uma de suas aulas. "Eu nem tinha encerrado a aula sabe, não tiveram nem o respeito pelo meu trabalho", descreveu o episódio.  

O novo posicionamento da escola teria se iniciado neste ano de 2021. Não se pode falar de religião, não se pode falar de política, nem contextualizar períodos históricos. Um dos professores demitidos, quando questionado por uma aluna sobre qual era sua religião, precisou dizer para a jovem aluna, o que também não é permitido. "Tem que falar assim: não podemos falar dessas coisas na escola", traduziu uma educadora. 

Num breve histórico no próprio site da escola, a entidade se classifica como proponente de uma educação inovadora aliada ao ensino de valores. 

A escola, no entanto, diz também se inspirar nas chamadas escolas High Tech High (HTH) —  unidades americanas que ganharam visibilidade após terem grandes admiradores como: Barack Obama, Oprah Winfrey e Bill Gates; em tais unidades a primeira coisa que se pode pensar é que elas devem se destacar por ter tudo o que de mais moderno nas salas de aula, mas não é só isso, que essas escolas, segundo os métodos, apresentam aos alunos.  “Nós somos atentos, mas não escravos do currículo nacional”, defende um dos criadores do método que diz que o mais importante é a integração entre o aluno e o professor, isso é, não é seguindo uma rígida "constituição de temas" que o método consiste.  

A reportagem entrou em contato com a escola para entender se está havendo então uma mudança na proposta de educação, de modo a privar os alunos de temas pertinentes à vida em sociedade e também se procede essa censura aos educadores. 

O artigo 5º da Constituição Federal garante a liberdade de expressão, enquanto o artigo 206 garante a liberdade de ensino. Assim, vedar, previamente, que professores falem sobre algo que “possa estar em conflito” com a convicção alheia contraria a Constituição.

O colégio disse que os temas sociais, na escola, são tratados de acordo com o planejamento pedagógico e a grade curricular de cada série. 

A escola explicou que os temas devem estar apropriados para as idades dos alunos. A escola defendeu que os coordenadores da unidade monitorem as aulas para ver se o que o professor está apresentando é "verídico".  

"Política, em nossa escola, é tratada de maneira a que nossas crianças e jovens possam compreender as estruturas da mesma. Sendo assim, os profissionais são orientados a não tratarem de política partidária", disse. 

"Orientamos e prezamos pelo bom senso sobre posicionamentos em redes sociais para quaisquer colaboradores da Instituição", justificou a empresa de educação, sobre a situação de privar que os professores se posicionem politicamente nas redes sociais. Pela resposta, a inexistência de uma opinião política é o que a escola considera "bom senso".

Apesar de nos três tópicos apresentados acima estarem evidentes que a escola está de fato orientando o que dizem os denunciados, a escola negou que tenha coagido os professores de arte ou mesmo os censurado. "Não praticamos censura e coação. Somos uma Instituição privada que contrata educadores que tenham compromisso com uma formação ética, estruturada no ensino de valores e de virtudes. Além disso, prezamos pela excelência no ensino, sempre condizente com a verdade e a realidade dos fatos e com o respeito à faixa etária dos estudantes", finalizou a empresa de educação.  

A reportagem havia perguntado também se as denúncias procedem, mas diante da resposta dada pela unidade, não é possível afirmar que a escola negou que tenha praticado as situações apontadas pelas fontes. 

O MS Notícias procurou a Associação Sul-Mato-Grossense dos Arte Educadores (Asmae), que disse não estar sabendo da situação a qual os educadores da unidade estariam, segundo denúncias, sendo submetidos. Sengundo a entidade, nesta terça-feira (6.jul) farão contato com a Escola para esclarecer os fatos.