26 de abril de 2024
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QUARTEL DA PM | BONITO (MS)

Quartel sob devassa: Capitão que substituiu Leonel é alvo; comando de Bonito rebate novas acusações

Comandante opina sobre o caso Leonel; "Vai ser condenado" e defende oficial destacado que o substituiu interinamente

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“Falei com o tenente [Leonel], ele será julgado e será condenado, você pode ter certeza disso”, a fala é do Tenente Coronel, Anderson Luiz Alves Avelar, comandante da 1ª Companhia Independente de Polícia Militar em Bonito (MS), tendo assumido o posto em 16 de setembro, mesmo que o 2º tenente André Luiz Leonel, agrediu uma mulher dentro do quartel da PM de Bonito, no interior de Mato Grosso do Sul. O MS Notícias denunciou o caso em 21 de novembro, trazendo imagens das agressões que ocorreram em 26 de setembro.

A fala do comandante ocorreu no momento em que ele respondia à reportagem sobre novas acusações, agora, feitas contra o subcomandante da região de Bonito, Capitão Francisco Solano Espíndola, conhecido apenas como ‘Capitão Solano’, que substituiu Leonel interinamente, sendo o oficial-destacado por Avelar para responder por Bodoquena, cidade em que Leonel atuava e era conhecido como o "Tenente Terror", no Comando do 3º Pelotão. 

Anderson Luiz Alves Avelar, comandante da 1ª Companhia Independente de Polícia Militar em Bonito (MS)Anderson Luiz Alves Avelar, comandante da 1ª Companhia Independente de Polícia Militar em Bonito (MS). Foto: Divulgação 

Solano está sendo acusado de ter feito uso de veículo da polícia para obter benefícios particulares, bem como estar usando os serviços de militares da corporação de maneira inadequada, além de perseguir os que não se submetem. “Nós abrimos inquérito para apurar todos os fatos denunciados. As denúncias ocorrem de policiais que foram transferidos por estarem na ocorrência do Leonel. Fazem as denúncias porque eles estavam estabelecidos aqui. O Solano, ele é um cara muito correto”, introduziu Avelar. 

Vídeos enviados ao MS Notícias mostram que Solano teria ordenado à policiais que levassem cheque assinado pelo Instituto Mirim Ambiental de Bonito, no valor de R$ 1 mil, à uma serralheria, para que fossem instaladas 2 portas de aço, mas destinadas não ao prédio da Mirim, e sim ao endereço de local onde seria a casa de Solano. O conteúdo das imagens não cita a entrega ou instalação das portas no endereço do Instituto, que funciona em um prédio da Sociedade Caritativa e Humanitária (Seleta), na Rua Luís da Costa Leite, na Vila Donária, em Bonito (MS). “Eu mesmo fui na casa dele ver a obra que estava fazendo lá, é uma varanda, não tem portas... as portas foram levadas posteriormente a Mirim, isso tem fiscalização, não é assim. Acontece que devido a pandemia, algumas coisas são entregues no endereço do Solano, já que o carro fica na casa dele”, argumentou Avelar. 

Solano é o policial responsável pelo relatório que livrou Leonel de uma punição no caso de um professor agredido em 2018. Segundo apurou a reportagem, no documento encaminhado à Corregedoria da Polícia Militar de MS, o Capitão teria atestado que não foi encontrado qualquer crime militar na conduta de Leonel e sua equipe.  

Documento do Inquérito Policial Militar, que livrou Leonel e equipe

No caso da mulher agredida algemada em 26 de setembro, dentro do quartel, sendo revelado apenas 1 mês após a agressão, foi montado o que para a PM é conhecido como “sindicância”: quando o objetivo é apurar se foram cometidos crimes ou erros internos no quartel. “Tem mais ou menos uns cinco ou 6 inquéritos abertos. Quem tiver que ser punido vai ser punido. Essa transferência dos envolvidos no caso do Leonel, veio do Comando Geral. Os militares que estavam no dia, parte deles respondem pelo crime de prevaricação, por não terem comunicado a oficial de dia”, relatou Avelar.

Leonel e cerca de 6 militares foram afastados. Leonel foi dispensado do cago de confiança que ocupava e está em serviços administrativos na PM de Campo Grande pelo período que é investigado. O inquérito, segundo Avelar, está sendo finalizado.    

Apesar disso, segundo fonte, “PMs chaves” que estiveram no dia da ação cometida por Leonel, não foram ouvidos na tal sindicância, mas teriam sido “transferidos”, sem direito a darem seus depoimentos sobre a agressão feita pelo 2º tenente. “Não permitiram falar, apenas transferiram, até quem nem estava na situação foi transferido”, revelou fonte.

Esses foram os PMs transferidos devido o caso Leonel

Avelar revelou que dois PMs, dentre os 6 que foram transferidos, são investigados por suspeita de ligação com tráfico de drogas. “A guarnição que estava no dia 26 e mais dois que estavam sendo investigados por suspeita de ligação com o tráfico, todos foram transferidos”, disse.

O denunciante, por sua vez, diz ter prints de ligações que teria feito à oficial de dia no 26 de setembro, a tenente Bruna Carla Sanches Rodrigues. Ela não teria atendido as ligações, devido a isso a situação do caso Leonel não teria sido comunicada. “Está sendo investigada toda essa situação. Mas eles poderiam ter ido até ela e comunicado o fato. Por isso, a partir de agora a porta da minha sala fica aberta aos colegas, podendo chegar em mim e comunicar... a situação de fato será revelada ao final desse inquérito”, explicou Avelar. 

Já a tenente Bruna disse que ela também está sob sindicância.  “Estou sob sindicância, estão sendo encaminhadas”, disse.    

A tenente Bruna também é apontada pelos denunciantes como uma militar “sem respeito” com os colegas. Além de ser acusada de não ter atendido ligação para comunicar o crime cometido por Leonel, em 26 de setembro. Essa informação, segundo denunciante, ainda não consta nos relatórios, pois policiais que tentaram comunicar a tenente sobre a situação no dia foram impedidos de prestar esclarecimentos na sindicância do quartel. “Ela não atendeu, era a oficial de dia, era a quem de direito deveria ser informada. Ela não atendeu e nem retornou às ligações... eles não querem ouvir isso”, explicou denunciante.

Conforme apontou a fonte, o corporativismo dentro do quartel estaria fazendo pressão para descobrir não os crimes cometidos pela PM, mas sim, tentando desvendar quem entregou o vídeo que mostra a agressão de Leonel à imprensa. “Parece que para eles, quem cometeu o crime foi quem denunciou a agressão e não a agressão em si”, comentou fonte. Avelar por sua vez disse: “Muito pelo contrário, ninguém quer saber quem foi. Não há interesse nenhum nem da corporação e nem dos companheiros de serviço nesse assunto. O único objetivo agora é apurar o que de fato aconteceu, ninguém quer saber quem foi”, rebateu o novo comandante. 

A tenente Bruna corroborou com a afirmação de Avelar sobre os denunciantes. “Vamos aguardar o encerramento da sindicância. Todas as informações acima são investigadas. Testemunha falar é fácil, querem fazer pressão porque foram transferidos”, argumentou a militar. 

No entanto, conversas que a reportagem teve acesso mostram que de fato há uma perseguição a certos militares dentro da corporação. Mensagens escritas e enviadas por militares que corroboram com o corporativismo dizem "Bons tempos esses que o inimigo era encontrado fora da caserna (casa, ciclo de amizades)". O conteúdo enviado faz ameaça direta àqueles que possam ter interesse em denunciar desmandos internos na PM.

SOLANO E A MIRIM

Solano no uso do microfone

O Capitão Solano é também o coordenador do Instituto Mirim Ambiental de Bonito, que em sua natureza jurídica trata-se de uma entidade civil de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecida como de Utilidade Pública Estadual. O projeto foi fundado em 2015 e oferece aos participantes reforço escolar, alimentar, atividades sociais, esportivas, culturais e artísticas. 

Segundo o denunciante, durante o horário de serviço, os PMs são obrigados entre outras coisas a levar materiais ao Instituto, bem como, prestar serviços de entrega de documentos, pneus entre outros serviços que não são comportados na função militar. As cobranças desses serviços são feitas durante toda semana. Equipes policiais estariam sendo obrigadas a fazer coisas pessoais para o Capitão, inclusive fora da escala de trabalho. Como ir à contabilidade, levar documentos de cunho pessoal, ir a lojas usando e tirando a viatura do serviço policial. “E se o militar se negar a fazer é pior, depois fica de perseguição. Viatura da PM em Bonito já foi usada até para fazer transporte de crianças do Instituto Mirim para um balneário da cidade”, destacou o denunciante. 

O Comandante Avelar disse que todas as parcerias com o Instituto Mirim são documentadas em cartório, sendo neste caso, devidamente autorizado o uso de viaturas policiais que estiver fora de serviço. 

OMISSÕES

A reportagem mostrou aqui no MS Notícias, que o conteúdo exclusivo publicado em 21 de novembro não havia sido relatado nem em boletim de ocorrência e que a reportagem antecedeu a oferta de denúncia feita pelo Ministério Público, onde a vítima, a senhora espancada, foi colocada como ré. Na decisão, do promotor Allan Carlos Cobacho do Prado, não foi citada as agressões desferidas pelo PM e apenas arrolaram a vítima como acusada e disseram que na situação os donos do restaurante eram as vítimas e os PMs eram apenas testemunhas.

Apesar das informações darem conta de que a violência contra a mulher ocorreu no dia 26, em boletins anexados no oferecimento de denúncia, constou que a situação ocorreu no dia 27 de setembro. No entanto, o próprio boletim contradisse as imagens registradas pelas câmeras de segurança, já que nas imagens é possível ver a data no topo do vídeo, indicando que a situação ocorreu de fato no dia 26 de setembro.

O comandante Avelar destacou que no que depender dele, todos os envolvidos que se omitiram no caso serão julgados e condenados. “Eu tenho 28 anos de carreira na PM, estou quase para ir para Reserva, faço esse trabalho aqui para entregar uma PM qualificada a população de Bonito”, finalizou Avelar. 

A reportagem tentou contato com a Mirim Ambiental de Bonito por meio de telefone disponibilizado na página do Instituto no Facebook, porém, as ligações não foram atendidas. 

Apesar de ser citado, o comando não transferiu o telefonema à Solano, caso ele deseje se manifestar sobre as acusações feitas, o espaço fica aberto.