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Rota Bioceânica

Brasil e Paraguai sacramentam Rota Bioceânica sexta-feira

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Uma ampla mobilização política, econômica e social, envolvendo lideranças e interlocutores de diversos segmentos, é o fator central de convencimento dos presidentes do Brasil e do Paraguai para assumirem a responsabilidade de materializar os investimentos em logística de transportes e infraestrutura para consolidar a sonhada integração da América Latina.

Na próxima sexta-feira, 21, o brasileiro Michel Temer e o paraguaio Mário Abdo Benites estarão autorizando oficialmente a construção de duas pontes entre os dois países, com recursos da Itaipu Binacional. A assinatura do acordo será no 6º andar do Edifício da Produção, localizada na área industrial da termelétrica, no Paraná, fronteira com o Paraguai.

Este é um dos sonhos mais antigos e importantes das nações do continente. Trata-se da expectativa de garantir um modelo de desenvolvimento próprio e seguro para a afirmação social, econômica e cultural latino-americana, visando a integração interna e buscando a autonomia, a valorização e a competitividade junto aos mercados da Europa, Ásia, África, Oceania e Estados Unidos.

FORA DO PAPEL - As duas pontes, ao serem construídas, vão tirar do papel as projeções que já eram vislumbradas desde o século XV pelos povos e personagens libertários da América que lutavam contra os desmandos da colonização, sobretudo a européia. Nos tempos modernos, este sonho se revitalizou e teve consigo alguns personagens que se destacaram. Em terras brasileiras, precisamente em Mato Grosso do Sul, os irmãos José Orcírio e Heitor Miranda dos Santos, e seu sobrinho Vander Loubet, perfilaram entre vozes influentes em defesa do investimento.

Outras lideranças de peso reforçaram o coro pró-bioceânica. José Orcírio, o Zeca do PT, já era governador; Vander, deputado federal; e Heitor Miranda se tornaria prefeito de Porto Murtinho, quando o então prefeito Reinaldo Azambuja (hoje governador reeleito), de Maracaju, juntou-se aos que desfraldavam a bandeira. O imenso cordão veio ganhando forças, cresceu substancialmente na gestão do governador André Puccinelli e em seguida entrou em cena, com peso decisivo, o deputado federal Carlos Marun, designado por Temer para ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência.

E foi com a autoridade política e ministerial que Marun sacramentou os passos determinantes para o Brasil plantar a semente que faltava: abrir o horizonte dos investimentos, com a viabilidade financeira assegurada pela Itaipu. Uma das pontes será construída no Rio Paraná, entre o bairro Porto Meira, em Foz do Iguaçu, e o município paraguaio de Puerto Franco, vizinho a Ciudad del Este, onde está localizada a Ponte Internacional da Amizade. A outra ponte vai ligar Porto Murtinho e Carmelo Peralta, no Paraguai.

ACORDOS - A construção das pontes com recursos de Itaipu Binacional foi autorizada por parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), assinado no dia 17 de dezembro. Segundo a AGU, “as duas obras fazem parte de acordos internacionais celebrados entre os dois países, mas ainda não foram realizadas em razão de restrições orçamentárias”.

Ainda de acordo com a AGU, a construção das pontes está “em consonância com os atos constitutivos da Itaipu Binacional, que admitem claramente a possibilidade de realizar projetos com vistas a desenvolver infraestruturas não diretamente relacionadas às instalações da organização, mas relacionadas ao bem-estar da comunidade local e ao desenvolvimento regional, de modo que tanto a segunda (em Foz) quanto a terceira ponte (no Mato Grosso do Sul) em questão estariam abarcadas em suas diretrizes e objetivos estratégicos”.

O parecer da AGU era o último detalhe jurídico que faltava para que os presidentes do Brasil e do Paraguai pudessem assinar a autorização para a obra. Ainda em relação ao parecer, o documento observa que a Eletrobras, holding da qual faz parte Itaipu Binacional, no lado brasileiro, “deu aval para a operação, desde que não implicasse aumento das tarifas de energia, o que já foi descartado pela binacional”, e desde que Itaipu, ainda, “não reduza os royalties que repassa à União”.

SEM ÔNUS - As obras não devem onerar o custo da energia comercializado pela hidrelétrica binacional, pois a tarifa de Itaipu está congelada em dólar e não há previsão de reajuste. O diretor-geral brasileiro de Itaipu, Marcos Stamm, afirma que o financiamento das pontes pela usina “vai desonerar o Tesouro, sem nenhum custo adicional para o consumidor de energia”.

O custo total previsto para essas duas pontes é de US$ 270 milhões, pouco mais de R$ 1 bilhão, investidos ao longo dos próximos dois anos e meio a três anos, prazo também previsto para a conclusão das obras. Pelo que foi acordado entre os dois governos e pela diretoria de Itaipu, a parte paraguaia da usina financiará a construção da ponte no Mato Grosso do Sul e a margem brasileira entrará com recursos para a ponte em Foz do Iguaçu. Agora, os projetos devem ficar a cargo do Departamento Nacional de Infraestrutura (Dnit). Os procedimentos para a construção devem ser iniciados já a partir do ano que vem.

Para Marcos Stamm, “com a construção das pontes, a usina de Itaipu estará investindo em duas importantes obras de infraestrutura, consideradas fundamentais e estruturantes para os países vizinhos, o que virá facilitar o comércio e a segurança na região de fronteira”. Ele lembra que “Itaipu tem um compromisso histórico com a região, principalmente em relação à área alagada”.

ALÍVIO - A segunda ponte entre Foz do Iguaçu e o Paraguai irá aliviar o trânsito de veículos pesados da Ponte Internacional da Amizade. Inaugurada em 1965, ela é hoje o principal corredor logístico socioeconômico entre Brasil e o Paraguai. Sua localização estratégica desempenha papel fundamental no desenvolvimento da região, impulsionando o comércio exportador e importador. Graças a esta antiga ligação, também, Ciudad del Este tornou-se a terceira maior zona franca do mundo, atrás apenas de Miami e Hong Kong.  Pela ponte circulam carros, caminhões, motos e pedestres. O tráfego está saturado. O fluxo diário de pessoas chega a 39 mil.

Com a ligação a Presidente Franco, a Ponte Internacional da Amizade ficará exclusiva para veículos leves e ônibus de turismo, o que vai dificultar também a entrada de contrabando nos dois lados da fronteira. Além disso, a segunda ponte permitirá a ligação entre a Rodovia das Cataratas e a BR-277 pela Perimetral Leste, por onde também trafegarão os veículos pesados que circulam entre Foz e a Argentina.

A licitação para os projetos básico e executivo dessa ponte já havia sido lançada pelo Dnit, mas foi cancelada em junho deste ano, por falta de recursos. A Perimetral Leste evitará o tráfego de veículos pesados pelo centro da cidade, hoje um dos maiores problemas de trânsito de Foz do Iguaçu, já que a Avenida Paraná, utilizada hoje para acesso à BR-277, tem relevo considerado irregular, provocando a constante quebra de caminhões, principalmente próximo à Avenida das Cataratas (acesso à Rodovia das Cataratas), e aumentado o risco de acidentes.

NOVA ROTA - A outra ponte, sobre o Rio Paraguai, que ligará o Mato Grosso do Sul ao Paraguai, entre Porto Murtinho e Carmelo Peralta, será fundamental para criar uma nova rota de exportação e importação. Para os produtores de grãos do estado, será criada uma nova logística de transporte, já que a ponte é uma das bases fundamentais para a ligação com os portos do Pacífico, depois de atravessar todo o Paraguai, que se tornará um “hub” regional de exportação e importação.

O país já está desenvolvendo obras rodoviárias para permitir o acesso de Mato Grosso do Sul aos portos chilenos, o que, para os produtores, representará uma redução nos custos de exportação para os países da Ásia, principalmente. A criação da nova rota para o Pacífico também incrementará as importações e exportações, tanto da Ásia quanto entre os países vizinhos, como o Chile, a Bolívia e a Argentina, além do próprio Paraguai.

A construção da segunda ponte na fronteira entre Foz do Iguaçu e o Paraguai é uma reivindicação antiga. Mas foi a posse do novo presidente do Paraguai, Mario Abdo Martinez, que trouxe novo alento à região. Foi ele quem propôs ao governo brasileiro que a Itaipu Binacional financiasse a construção, tanto da ponte Foz-Presidente Franco como a de Porto Murtinho-Carmelo Peralta, já que não havia recursos disponíveis no orçamento. O presidente Michel Temer deu o aval para o início das negociações.

O presidente Mario Abdo Benítez, em sua visita como presidente eleito ao Brasil, disse ao presidente Michel Temer que “é inaceitável que, com todo o comércio e oportunidades que temos juntos, tenhamos apenas uma ponte”, a da Amizade, construída há 53 anos.