28 de março de 2024
Campo Grande 30ºC

NOVAS DENÚNCIAS | HARMONIA BILÍNGUE

Escola 'chique' é acusada de "defender Hitler" e negar atendimento a mãe de aluna

Denúncias contra escola particular continuam a surgir; MPT abre procedimento para apurar acusações

A- A+

Recentemente acusada de estar demitindo professores que tocassem em "temas proibidos” a escola Harmonia Bilíngue, da educação privada de Campo Grande (MS), agora tem mais duas denúncias: uma vem de um educador e outra de uma mãe de aluna.

A mãe diz que a filha, de apenas 10 anos, foi agredida verbalmente pela coordenadora Mariana Melo. Ao pedir uma reunião com os diretores para esclarecer os fatos, a mãe diz que não conseguiu devido a agenda dos diretores. “Quero falar sobre os abusos que esta escola vem cometendo”, introduziu a advogada Camila Zanllutti, de 37 anos.

Segundo Camila, a filha é estudante do 4º ano e em 17 de agosto chegou aos prantos em casa após ser levada à coordenação da escola na Unidade 1 – localizada na Rua José Caetano – Jardim Bela Vista. “Ela contou que estava brincando com um amigo e acabaram caindo na sala, momento em que uma monitora os levou à coordenação. Chegando lá, minha filha disse que a coordenadora passou a gritar, gritar muito com ela. Ela ameaçou dizendo que minha filha iria reprovar, mesmo ela tendo boas notas. A minha filha está extremamente assustada com a atitude da coordenadora e não quis mais ir para a escola. Hoje [quarta - 18.ago] eu fui lá e solicitei a transferência dela, já que a Escola não quer dizer o que aconteceu de fato, entendi que falam só se quiser e com quem quiser”, opinou.

A mãe disse que ainda ontem entrou em contato com a escola pedindo um horário para reunião com os diretores. Ela disse que tinha urgência na reunião para esta quarta ou um outro dia. Em mensagens trocadas com a administração, a própria Mariana Melo responde dizendo que a reunião “dependia da agenda dos diretores”, que por isso a mãe deveria relatar o fato à própria coordenadora. “Aí eu me pergunto, se a coordenadora é a acusada de cometer o ato, eu vou reclamar para ela mesma? Os diretores não têm tempo de se reunir com os pais dos alunos? Que tipo de escola é essa?”, perguntou a mãe. Além da menina de 10 anos, a mãe tinha outra criança de 4 anos estudando na escola. "Eu vou tirar as duas", disse.  

A reportagem indica a sequência do diálogo por meio dos números e cronologia dos fatos em azul.A reportagem indica a sequência do diálogo por meio dos números e cronologia dos fatos em azul. Foto: Reprodução 

Camila contou que tomou coragem de denunciar porque muitas mães ficam com medo. “A todo momento eles escondem o que acontece lá. O bullying acontece sempre, as crianças e jovens ‘mais ricos’ humilhando e excluindo os que não tem tanto dinheiro. Isso tudo acontece lá, mas ninguém fala e quando a escola é cobrada fica falando que vai melhorar, mas nada de concreto é feito. Eles protegem os agressores e escolhem quem vão castigar”, relatou Camila.

Se confirmado que a coordenadora gritou e causou pânico na criança, ela pode ser enquadrada na Lei do aluno contra o professor. Há ainda a defesa ao aluno na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o Plano Nacional de Educação, o Plano de Desenvolvimento da Educação, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e em alguns capítulos da Constituição Federal. Todos esses determinam que cabe aos educadores apenas: garantir que os alunos aprendam. Ao mesmo tempo, o Estatuto da Criança e do Adolescente diz que o educador ou educadora que humilha o aluno comete crime. 

‘IMAGEM DE HITLER’

Ao tomar conhecimento das denúncias feitas no MS Notícias por professores, um educador que trabalhou na escola Harmonia (em duas unidades) em 2017, procurou a reportagem para confirmar a veracidade do que era dito pelos denunciantes. Ele lembrou que foi repreendido e posteriormente demitido por não se referir ao ditador alemão Adolf Hitler do ‘jeito certo’.

De acordo com o professor, que terá o nome preservado, uma aluna na sala de aula teria ‘elogiado’ a trajetória de Hitler, dizendo que seus pais contaram para ela que o ditador “foi um cara inteligente”. “Eu respondi naquele momento que não há nada de inteligente em matar milhares de seres humanos em função de apenas ter poder. As salas têm monitores, a minha fala foi levada à coordenação que tentou me reprimir para sei lá, falar do jeito certo de Hitler? Qual o jeito certo de se referir a esse personagem que envergonha a sua nação até os dias atuais?”, questionou o professor.

O MS Notícias apurou que até mesmo após a demissão, os professores são obrigados a assinar um ‘termo de sigilo’ que diante disso acabam sendo ‘amordaçados’. A escola possui influência sobre outras unidades particulares. “Eles ligam de escola em escola passando uma ficha falsa de que a pessoa é um mau educador ou educadora e coisas desse tipo levam as pessoas a não denunciar”, relatam.

A ESCOLA

Procurada, a Escola Harmonia iniciou sua defesa dizendo que as salas de aula não têm câmeras de monitoramento, apesar disso, não foi dito que elas possuíam tais equipamentos. “Há, sim, câmeras para as aulas remotas, durante este período da pandemia”, argumentou. 

A escola negou que tenha defendido o ditador. “Nunca, em 28 anos de história, houve qualquer forma de defesa de ditadores, nem de regimes sanguinários como o nazista, o comunista ou o fascista”, destacou a unidade. 

O Harmonia ainda disse que nunca houve nenhuma agressão verbal a nenhum dos alunos. “Quando os estudantes apresentam condutas e comportamentos inadequados que não correspondam com as regras da Escola, recebem medidas disciplinares. Imediatamente os pais e responsáveis são informados de tais condutas dos filhos”, explicou, indicando que a mãe e a criança estariam mentindo sobre o espisódio. Apesar disso, a escola não comunicou a mãe sobre o ocorrido com a filha de 10 anos.  

A escola não explicou o porquê, então a mãe não foi informada do episódio. O Harmonia disse ainda que todas as famílias, quando solicitam conversar com a Escola, são atendidas pelas orientadoras educacionais da série em que o aluno estuda. “Sendo assim, sempre que necessário, esse quadro de profissionais está disponível para atender os pais”, finalizou sem explicar o porque a direção não quis receber a mãe.  

O MPT

O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS) disse que abriu um procedimento para verificar se as demissões promovidas pela escola teriam motivação por orientação política, religiosa e/ou filosófica. “Instada a manifestar-se, a escola noticiada negou a ocorrência dos fatos e afirmou que as aulas são realizadas de acordo com o planejamento pedagógico semanal e inexiste qualquer discriminação, especialmente em relação aos educadores de artes, mencionados na reportagem que deu suporte à denúncia”, destacou o órgão. 

Ainda conforme o MPT-MS, foram ouvidos sete demitidos em 2021 e nenhum deles, diz o órgão, confirmou os fatos relatados na reportagem. “Destaca-se que dois professores são da disciplina de artes”, acrescentou o MPT. “O MPT concluiu pela não comprovação dos fatos narrados na reportagem e promoveu o arquivamento do referido expediente investigatório”, finalizou o órgão fiscalizador. 

O MS Notícias pediu ao órgão que orientasse os professores que fossem submetidos a situações semelhantes às narradas na reportagem (*1_ suprimido). O MPT-MS disse que disponibiliza os seguintes canais de comunicação para cadastro de denúncias: portal www.prt24.mpt.mp.br/servicos/denuncias e aplicativo MPT Pardal (disponível para os sistemas Android e iOS).

A Associação Sul-Mato-Grossense dos Arte Educadores (Asmae) disse que está  acompanhando e, “esperamos que os fatos sejam esclarecidos, sobretudo no que se refere à liberdade de expressão”, manifestou. 

*EDITAMOS - ÀS 18H49 DESTA QUINTA (19.AGO) INSERIMOS UM TRECHO *1_ COM ORIENTAÇÕES DO MPT-MS À TRABALHADORES.