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MPE ajuíza Ação Civil Pública contra Fundac referente a "Quinta Gospel"

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O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio da titular da 67ª Promotora de Justiça dos Direitos Humanos da Comarca de Campo Grande, Jaceguara Dantas da Silva Passos, propôs Ação Civil Pública contra Campo Grande e Fundac (Fundação Municipal de Cultura), pleiteando que os requeridos se abstenham de favorecer determinados grupos e religiões, seja no projeto “Quinta Gospel” ou em qualquer outro projeto semelhante do Poder Executivo Municipal, devendo atuar segundo balizas político-sociais do interesse público e de não se pautar em dogmas religiosos, assim como para determinar ao município que cancele o evento “Quinta Gospel” marcado para hoje, sob pena de multa cominatória diária em valor a ser fixado pela Justiça para a hipótese de descumprimento da ordem judicial por parte dos requeridos.  A Ação Civil Pública foi distribuída sob o nº 0834977-84.2014.8.12.0001 para a 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Comarca de Campo Grande.

Segundo a Promotora de Justiça, o perigo na demora na prestação jurisdicional pleiteada se torna evidente quando se verifica a relevância dos bens jurídicos ora tutelados e o uso indevido de recursos e bens públicos municipais, advindos do pagamento de impostos de todos os munícipes, independentemente da religião que professem ou deixem de professar, em auxílio a evento que beneficia exclusivamente um grupo religioso, qual seja, o evangélico da Capital.

Lembra que a atuação do Município de Campo Grande não pode criar privilégios e favorecer uma ou outra religião, seja no projeto “Quinta Gospel” ou em qualquer outro projeto semelhante, sob pena de manifesta infringência ao inciso I do artigo 19 da Constituição Federal de 1988 e aos princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade, desprezando a indispensável e exigível postura igualitária e imparcial da atuação do Poder Público.

O direito de optar por seguir os dogmas e preceitos de determinado segmento religioso ou até mesmo, não seguir, constitui-se em direito inalienável e assegurado constitucionalmente, mas tal questão deve restringir-se ao aspecto íntimo e familiar, não podendo constituir-se motivação para a prática de atos administrativos e estabelecimento de privilégios, explica a Promotora de Justiça.

Esclarece também que o dever constitucional de laicidade ao Ente público impõe ao Município de Campo Grande a indispensável imparcialidade com relação a todos os credos religiosos e seus cultos, vedado estabelecimento de benefício unicamente a esta ou aquela religião em detrimento das demais, ainda que mediante lei, por não encontrar fundamento de validade na Constituição Federal e pela manifesta ofensa à honra e dignidade dos grupos religiosos, direito transindividual cuja tutela é objeto da presente Ação Civil Pública, nos termos do artigo 1º, inciso VII, da Lei nº 7.347/1985 com redação dada pela Lei nº 12.966/2014.

O Procedimento Preparatório que baseou a Ação Civil Pública iniciou-se no mês de agosto deste ano, quanto a Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos recebeu do Vereador Eduardo Romero (PT do B), integrante da Câmara Municipal de Campo Grande, ofício, bem como representação subscrita pelo Presidente da Federação de Cultos Afro Brasileiros e Ameríndios de Mato Grosso do Sul, Iraci Barbosa dos Santos, em face da Fundac, que questionaram a aplicação da Lei Municipal nº 5.092/2012 que instituiu a “Quinta Gospel”, atividade artística-musical destinada tão somente a um único segmento religioso.

O questionamento se justificou em razão da Fundação ter sido contrária à solicitação efetivada pela aludida entidade, no sentido de apresentação musical de artistas que desenvolvem um trabalho centrado na cultura e religiões de matrizes africanas e espíritas na “Quinta Gospel”, conforme ofícios da lavra do Presidente da Tenda de Umbanda “Pai Joaquim de Angola” e Of.ICEMS/MS subscrito pelo Presidente do Instituto de “Cultura Espírita de Mato Grosso do Sul”.

Segundo a Fundac que a pretensão anteriormente retratada “foge da proposta do evento”, alegando que a citada Lei Municipal possui o propósito de oferecer atrações regionais e nacionais do meio “gospel evangélico”.

Em resposta, a Procuradoria-Geral do Município mediante ofício recebido no Ministério Público Estadual no dia 24 de setembro de 2014, informou que se encontra em trâmite na Câmara Municipal de Campo Grande, projeto de lei de iniciativa do Vereador Eduardo Romero, versando sobre a alteração da lei da “Quinta Gospel”, razão pela qual solicitou o arquivamento do Procedimento Preparatório, pela perda do objeto, assim como manifestou o entendimento de desnecessidade de firmar Termo de Ajustamento de Conduta já que a matéria, ao seu sentir, estaria exaurida no âmbito do Poder Legislativo Municipal.

Contudo, até o presente momento, o Município não apresentou resposta concreta sobre a revogação da combatida lei e nem mesmo se dispôs a firmar Termo de Ajustamento de Conduta, sendo que o Projeto de Lei nº 7.825, de 4 de setembro de 2014, que institui a Quinta Cultural e revoga a Quinta Gospel, de autoria do vereador Eduardo Romero, está em tramitação e não foi incluída da na pauta da 72ª Sessão Ordinária da Câmara Municipal.

E mais, segundo a Promotora de Justiça, contrariando os termos da Recomendação nº 06/2014, expedida pelo Ministério Público do Estado no bojo do supracitado Procedimento Preparatório, devidamente publicada no Diário Oficial do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, no dia 14 de agosto de 2014, o Município realizou evento relativo a “Quinta Gospel” no mesmo dia, com show da cantora “Cassiane”, na Concha Acústica Família Espíndola, na praça do Rádio Clube, na Capital.

No dia 26 de agosto, a Prefeitura Municipal de Campo Grande realizou novo evento destinado ao público evangélico denominado “Marcha para Jesus” e no dia 29 do mesmo mês, o evento “1º Sarau Gospel”, utilizando-se para tanto de recursos públicos, advindos do pagamento de impostos de todos os munícipes, independentemente da religião e até mesmo de pessoas que não professam qualquer credo, beneficiando, conforme anteriormente ressaltado, exclusivamente os cidadãos integrantes de um único segmento religioso, realizando uma inaceitável segmentação social em face da orientação religiosa.

Por fim, a Prefeitura Municipal de Campo Grande, por meio da Fundação Municipal de Cultura, programou para hoje, na Praça do Rádio Clube, às 19h, na Capital, mais um evento do projeto “Quinta Gospel”, reunindo três bandas evangélicas, cujo extrato de contrato com a destinação do recurso público para  referido evento, até o presente momento, não foi publicado no Diário Oficial do Município de Campo Grande.

Não obstante a instauração do referido Procedimento Preparatório e expedição da Recomendação pela 67ª Promotoria de Justiça objetivando a efetiva laicidade do Município de Campo Grande, evitando-se a interpretação da Lei Municipal nº 5.092/2012 que instituiu a “Quinta Gospel”, no sentido de apenas beneficiar um único segmento religioso, certo é que a mesma foi ignorada e foram e estão sendo realizados novos eventos pelo município com uso de recursos financeiros e outros bens da entidade municipal, em data posterior a publicação da Recomendação Ministerial contemplando exclusivamente um segmento religioso, em detrimento das demais manifestações religiosas, que a teor do artigo 215 da Constituição Federal somente podem ser subsidiados na vertente cultural.

Karla Machado com MP