25 de abril de 2024
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Sem utilidade, TCE-MS pode agonizar no paredão ético

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Em seus 35 anos de existência o Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul nunca rejeitou as contas de nenhum dos sete governadores. E são os governadores, ao lado de deputados estaduais, os responsáveis diretos pela indicação, aprovação e nomeação dos membros desse colegiado pelo qual serão julgados. Em resumo: político julga a prestação de contas do político. E com um detalhe substancial: o político julgador deve seu cargo – vitalício e polpudo - ao político julgado. Na comparação clássica é lobo cuidando de lobo.

Para ocupar uma das sete vagas do Conselho Deliberativo do TCE-MS o interessado precisa ter merecimento político como principal item qualificador. De nada adiantará preencher requisitos de capacitação técnico-científica se não estiver nas graças das duas instituições que, pela lei (Constituição Estadual), são as únicas autorizadas a promover o processo de investidura: o Executivo e o Legislativo.

Como órgão auxiliar do Legislativo, o próprio TCE também tem o direito de fazer a chamada indicação meritocrática. O rodízio das indicações acompanha a rotatividade das vagas. A cada conselheiro que se aposenta é um poder que chancela o substituto ou a substituta. Em sete vagas, hoje só duas estão preenchidas tecnicamente por servidores de carreira. As outras cinco são ofertadas politicamente como um prêmio de gratidão, recompensa ou até homenagem – mas sem perder de vista o deduzível compromisso de pagar gratidão com gratidão na hora de apreciar e julgar os balancetes de gestão.

Desde que começou a funcionar e ao longo do tempo o TCE firmou-se no cenário do poder político do Estado como um dos mais generosos guarda-chuvas do empreguismo. Como é um órgão que escapa à vigilância mais detalhada sobre seu tamanho real em pessoal e benefícios salariais extras – a ponto de receber da sociedade a comparação de que é um poder que só presta contas a Deus -, o Tribunal encara as cobranças da opinião publica quase com indiferença.

Mais de 180 candidatos aprovados em concurso há dois anos aguardam ser chamados. Nesse período, cada troca-troca de conselheiros e a mudança de Mesa Diretora puseram na folha de pagamento um novo e bem-remunerado lote de funcionários em cargos de comissão. Pressionado, o presidente do TCE, Waldir Neves – que substituiu Cícero de Souza -, anunciou que demitira 260 funcionários terceirizados que prestavam serviços contratados em polêmicos e questionados convênios com a Seleta Sociedade Caritativa e Humanitária (SSCH) e a firma Limpa Mesmo.

A pá de cal na credibilidade do Tribunal de Contas está sendo jogada com o arrastado e sintomático processo de preenchimento da vaga que estava destinada ao hoje ex-deputado Antonio Carlos Arroyo. Em 2014, ele deixou de candidatar-se à reeleição pelo PR seguro de sua indicação para o Conselho. A indicação, feita pelo governador André Puccinelli, foi aprovada pelos colegas, enquanto o jogo combinado também se desenrolava na Corte, onde o conselheiro José Ricardo, interinamente na presidência, acelerava sua própria aposentadoria para abrir a vaga. Mas Waldir Neves, ex-presidente do PSDB e amigo do governador eleito, Reinaldo Azambuja, articulou para que a aposentadoria fosse anulada e brecou a investidura de Arroyo. O caso foi parar na Justiça, mas está explícito que há uma guerra política.

Diante disso, a politicagem, em uma de suas formas mais brutas e desafiadoras, põe no paredão ético a existência de um Tribunal que foi criado para ser exemplar na fiscalização e no controle da probidade com as verbas publicas e acaba trafegando em rumo totalmente oposto. Repete-se na sua inutilidade em relação às expectativas da sociedade e, refém da concessão política e cartorial que lhe deu vida, segue engolindo avidamente do orçamento estadual gordos repasses financeiros que poderiam ser melhor aplicados, por exemplo, em saúde, educação e realização de concursos para profissionalizar o serviço publico e riscar dele mais um dos focos de desperdício.